NO BALUR I STA NA NO KUNCIMENTI, PA KILA, NO BALURIZA KUNCIMENTI!...
A informação
bancária de 31 entidades angolanas com contas no banco HSBC, na Suíça, e com um
valor de depósitos de US $36 milhões, revela que grande parte dos seus
titulares são comerciantes de diamantes estrangeiros. A lista dos nomes
relembra as vezes que o presidente atribuiu a nacionalidade angolana a
traficantes de armas e a suspeitos de crimes de corrupção e evasão fiscal. Mas,
em Angola, estes cidadãos são ilustres, alguns são mesmo amigos e sócios de
Isabel dos Santos, condição que em Angola continua a permitir que se esteja
acima da lei e da dignidade dos angolanos.
A lista faz parte da divulgação de informação bancária referente aos anos de
2006 a 2007, obtida pelo jornal francês Le
Monde, e que o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos
(ICIJ) colocou à disposição de colegas em várias partes do mundo, incluindo o Maka Angola.
Os ficheiros do banco,
colocados à disposição dos jornalistas e analisados pelas autoridades
francesas, estão incompletos mas permitem aferir os clientes por país. Sabe-se
que, em muitos casos, o cliente apresenta três a quatro nacionalidades
diferentes, optando o banco por identificá-lo como nacional do pais com o qual
tem maior relacionamento financeiro.
No topo da lista de clientes identificados com a nacionalidade angolana,
encontram-se cidadãos judeus originários da Bélgica e de Israel, todos ligados
ao sector dos diamantes. A mais importante dessas figuras é Guy Laniado, de 43
anos, então gerente da Ascorp. Esta empresa foi criada em 2000 pelo traficante
de armas Arkady Gaydamak, com o objectivo de comercializar exclusivamente os
diamantes angolanos. Em troca da exclusividade do negócio de diamantes,
Gaydamak assegurou apoio técnico-militar israelita para o combate decisivo
contra Jonas Savimbi.
Gaydamak conhecia o negócio das armas, mas desconhecia o negócio dos diamantes,
tal como ele próprio declarou, em 2013, a um tribunal londrino. Por essa razão,
segundo o seu argumento, associou-se a empresários conhecedores do sector de
diamantes, como Ehud Laniado (parente de Guy), Sylvain Goldberg e Lev
Leviev. Tudo tem um preço familiar no reinado da presidência de Dos Santos. Não
bastava Gaydamak fornecer as armas e a ajuda militar ao governo angolano, a
família do presidente fazia também parte da equação do negócio. Gaydamak
reservara 24.5 por cento das acções da empresa para Isabel dos Santos, a
primogénita do presidente angolano. Gaydamak e Isabel dos Santos oficializavam
assim a sua parceria de sócios. E os recursos de Angola eram usados pelo
governo de Angola, mas, no mesmo negócio, o presidente garantia que a sua
família seria a maior beneficiada.
Para se aferir a influência de Guy Laniado em Angola, o Maka Angola recorre, mais uma vez, ao
testemunho de Arkady Gaydamak no tribunal de Londres. Em parelha com outro
traficante – Pierre Falcone –, Gaydamak foi um dos grandes pilares do
presidente José Eduardo dos Santos nos últimos anos da guerra. Ambos obtiveram
a nacionalidade angolana e passaportes diplomáticos pelos seus serviços de
fornecimentos de armas e assistência técnico-militar para o aniquilamento dos
rebeldes.
Em 2003, para garantir a libertação de Pierre Falcone, que se encontrava detido
em França no âmbito do escândalo Angolagate,
o presidente nomeou-o ministro conselheiro da embaixada de Angola junto da
UNESCO. Protegido pela imunidade diplomática criada pelo Estado angolano,
Falcone foi libertado e instalou-se em Angola. O escândalo Angolagate comportava suspeitas de tráfico de
armas, branqueamento de capitais, corrupção de dirigentes franceses e angolanos
e evasão fiscal. Para não ser apanhado pelo processo nas teias da justiça
francesa, Gaydamak rapidamente se refugiou em Israel, conseguindo assim evitar
a sua detenção sob o mesmo processo. O petróleo angolano abafou o caso.
Gaydamak declarou que a segurança da Ascorp para o combate ao garimpo ilegal
estava sob tutela de Ehud Laniado. A Gaydamak cabia o controlo e a
operacionalidade dos ex-comandantes e oficiais do exército israelita e
ex-directores e operativos da Mossad, que prestavam assistência ao governo para
a eliminação da guerrilha.
Como Ehud Laniado não apresentava resultados satisfatórios, quer para o governo
quer para os seus sócios, as autoridades angolanas decidiram terminar o
referido contrato.
Tal como disse Gaydamak ,“o seu filho [Guy] operava em Angola e tinha boas
relações com Isabel dos Santos, e eu sei que ele [o filho] convenceu a Isabel,
a filha do presidente, que a segurança deveria permanecer sob controlo da
empresa belga [do seu pai Ehud]”. Um antigo funcionário dos Laniado
afirma, ao Maka Angola,
que Guy é sobrinho de Ehud.
Quando o juiz inglês perguntou a Gaydamak qual era o envolvimento do presidente
José Eduardo dos Santos na gestão da Ascorp e com os seus gerentes, a sua
resposta foi directa: “O presidente, em Angola, controla tudo.” A seguir,
Gaydamak esclareceu que tudo o que tinha a ver com recursos naturais, sobretudo
petróleo e diamantes, estava sob controlo do presidente.
Os Laniado e a família presidencial
Antes da criação formal da Ascorp, entre 1998 e 1999, Gaydamak estabeleceu
negociações com Ehud Laniado, para a compra de diamantes em posse de Isabel dos
Santos.
Já com a Ascorp em funcionamento, segundo Gaydamak, “os verdadeiros lucros eram
obtidos através da Welox [de Laniado e Leviev], a quem a Ascorp vendia os
diamantes comprados aos produtores, por Lev Leviev e o Laniado Group”. Os
lucros e diamantes da Welox eram divididos a meias entre o grupo controlado por
Ehud Laniado (que, por sua vez, dividia os seus lucros com Sylvain Goldberg e
Isabel dos Santos), e o grupo controlado por Arkady Gaydamak e Lev Leviev. Ao
Estado angolano cabia a fama da sociedade.
Se, por um lado, é possível compreender que o presidente tenha atribuído
nacionalidade e estatuto diplomático a Gaydamak e a Falcone, por gratidão pelo
seu contributo na guerra, como se pode justificar que Angola proteja Guy
Laniado? A única explicação plausível é a sociedade e a amizade de Laniado com
Isabel dos Santos. Ou seja, os interesses da família presidencial sobrepõem-se
aos do Estado angolano.
Estes exemplos demonstram que a atribuição da nacionalidade angolana tem sido
usada como ferramenta de negócio pelo presidente e a sua filha. No entanto, as
negociatas dos Laniado com Isabel dos Santos eram ilícitas e, em alguns casos,
ambíguas à luz da legislação angolana.
Para dissipar quaisquer dúvidas sobre casos semelhantes, em Setembro de 2014 o
presidente orientou seu partido, o MPLA, para a aprovação do anteprojecto de
Lei da Nacionalidade. O presidente passa a ter poderes legais exclusivos para
atribuir a nacionalidade a quem quiser e como bem entender. Na verdade, é isso
que tem acontecido, ainda que à revelia.
Segundo o anteprojecto, o presidente “pode conceder, sem faculdade de delegação
da Assembleia Nacional, a nacionalidade angolana, naturalização, aos
estrangeiros que tenham prestado ou sejam chamados a prestar serviços
relevantes ao Estado angolano”.
Muitos dos indivíduos a quem o presidente tem atribuído a nacionalidade
angolana são de idoneidade duvidosa.
Por exemplo, a empresa dos Laniado e de Sylvain Goldberg, na Bélgica, a Omega
Diamonds, para onde têm sido canalizados os diamantes de Angola e República
Democrática do Congo, está envolvida na maior história de evasão fiscal,
branqueamento de capitais e defraudação das autoridades alfandegárias neste
país. Em 2013, a Omega Diamonds comprometeu-se a pagar uma multa de US $180
milhões às autoridades belgas para por termos às investigações criminais. O
caso continua no Tribunal Supremo da Bélgica
Outros indivíduos que também fizeram os seus depósitos na Suíça como angolanos
são Jacob Karko, director da Ascorp; Tal Schechter, financeiro da Ascorp;
Jacques Norbert Davids, um dos principais compradores de diamantes da Ascorp, e
Eran Nativ, sobrinho de Ehud Laniado.
Há também três comerciantes estrangeiros, listados como angolanos, com contas
no HSBC na Suíça, nomeadamente Zulfikarali Adatia, Noureen Jamal-Adatia,
Mahmoud Alidina.
No entanto, tratando-se de angolanos, o caricato impera. Quem detém o maior
montante depositado no período em apreço é uma cidadã, Elsa Maria Matos Almeida
Teixeira, que se apresenta no banco como dona de casa e tem um pecúlio de 7
milhões e 167 mil dólares.
Por sua vez, Guy Laniado instalou-se em Londres, onde fundou e dirige uma
empresa destinada a criar oportunidades de negócios para os seus clientes em
África, na Ásia e na Europa. Segundo o website da sua empresa Northcross,
depois de dez anos de trabalho no sector dos diamantes em Angola, Guy Laniado
apresenta-se “como um dos maiores especialistas na indústria e tem trabalhado
estreitamente em vários projectos mineiros no país”.
Laniado reclama também ter sido conselheiro do Estado na aprovação de nova legislação
“para tornar o comércio dos diamantes mais seguro e mais transparente”.
“Actualmente, Guy continua como conselheiro de altos dirigentes no sector
diamantífero”, lê-se no seu website.
Sobre o caso, o sociólogo João Paulo Ganga apenas lamenta: “O grande dilema é
que o Estado está nas mãos de delinquentes. Há um processo de privatização do
Estado. Falar de leis é complicado porque aqui [em Angola] o poder é unipessoal
e do presidente”.
“A nacionalidade é atribuída por um órgão de soberania, o presidente, a
Assembleia Nacional ou um órgão judicial, mas os órgãos de soberania estão
sequestrados pelo vontade e poder de um só homem. As leis são apenas para
legitimar a sua vontade”, conclui o sociólogo.
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