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segunda-feira, 24 de abril de 2017

Crônica: ÔTÉPE – O LIVRO DA PALAVRA.

NO BALUR I STA NA NO KUNCIMENTI, PA KILA, NO BALURIZA KUNCIMENTI!...

Em tempos de mufunesas, em tempos das perdições ideológicas, pus-me hoje de manhã a pensar em como, a cada ano novo que chega, principiamos, em sonho diurno, novos planos, novos projetos de vida.
 
Foi, então que aí, realizando uma viagem no tempo, na medida em que pretendia eu repor o tempo ao seu começo, restaurando-o no manancial das Origens, bebendo a água que jorra do tempo primordial, que dei conta do quanto os homens públicos deste país são uns autênticos patetas.
 
Quisera eu rememorar o ano transato, mas quando ponho os olhos no passado, só vejo o vazio, e sinto náusea. Se os ponho no presente, a poeira do Saara, aliada à mediocridade nacional, cega-me. E, para a minha infelicidade, e talvez mesmo, para a infelicidade geral da nação guineense, um túnel se apresenta oco e opaco quando fito os olhos em direção ao futuro.

Bom mesmo é que neste ano novo se procedesse a purificações e à expulsão dos demónios que rondam a pátria, dos maus espíritos instalados na República. Alguém disse, certeiramente, que existem interesses instalados, o mesmo cidadão incauto reconheceu todavia que tinha dificuldades em lutar contra estes mesmos interesses.
Terá ele tentado, ou terá também ele procurado impor os seus interesses e os dos seus séquitos em busca do poder sem que, entretanto, tivessem eles, seus séquitos, faculdades intelectuais para o conseguir, e nem tão pouco, condições morais de condenar os outros?
Ora tudo isso me levou de volta às histórias que a minha avó me contava, quando menino,sobre as simbologias das minhas raízes biombense.
Assim, dizia-me àquela sábia mulher:
  1. A casa
Ela é, desde o princípio, o símbolo de sustentação. Portanto, um Psap (Firkija). Pois é a ela que se abre o olhar do homem – no sentido lato do termo, isto é, da humanidade, à história secreta, sacralizada e sagrada do homem e do Cosmos –, o Universo.
 
Se vivermos bem nela, e se a respeitarmos como espaço sagrado, todo o processo de combustão orgânico anula todos os pecados tanto do indivíduo quanto os da comunidade no seu conjunto. Não se trata, portanto, de uma simples purificação.
 
Pois, segundo ela, os crimes, a confusão social, simbolizam a regressão do Cosmos ao Caos.
 
Ao que tudo indica está instalado não apenas interesses escusos, mas sim o caos, porque o centro vértice do poder, perdeu o controlo do comando. E o país ficou à deriva. Os forasteiros associaram-se aos delinquentes de plantão.
 
Violar a casa em que se é hóspede – este Chão de NTIN é sagrado, estão avisados -, é abrir-se à definhação, permitir-se à perdição. E ao associar-se aos velhos malandros, o senhor capataz incapaz perderá o rumo.
 
Cabe, por conseguinte, a seguinte questão: E os quinzes maltrapilhos? Serão eles, quiçá, os piolhos da delinquência?
  1. O tempo
Quinze em 2015. Quantos serão no próximo ano? E no ano do Juízo Final?
Dizia-me a minha avó:
 
O tempo jorra, corre, flui como se fosse água. Move-se à esquerda e à direita, avança e recua; derrama como leite derramado; mas nunca conseguimos apanhá-lo.
 
O tempo derrama e pode provocar derrame.
 
Bate nas margens da vida. Queria eu dizer, nas margens do rio, nas margens do mar, nas margens dos Oceanos, todos eles, sem distinção.
 
E, neste instante em que o bater do tempo acontece, sorrateiramente, as águas do tempo voltam ao centro do rio e/ou do mar, como a primeira aparição, no tempo inaugural da angústia: 2015.
 
O caminho do tempo presente é seguir escrupulosamente o Acordo. A palavra, por sinal,vem do latim: COR, CORDIS, e significa coração. Acordo e celebração do pacto das vontades do coração, cedendo-se ali para ganhar acolá; e no fim, todo o mundo sai ganhando.
 
Espero ter dado pistas aos ilustres ignorantes.
E completava ela:
– Sinta-te mais livre, e mais puro se conseguires livrar das tuas faltas e dos teus pecados.
 
E, gentilmente, eu a respondia:
– Não tenho pecados, mas se os tiver, tenho imenso gosto em cometê-los, depois vou à igreja confessar-me ao Padre.
 
  1. O fogo
Na Baloba da nossa tabanka, Ulyssun, lembro-me ainda quando de olhos estupefactos, acendia-se, aliás, estava em estado de permanência o fogo no Wkassa (o Sacrário, não tenho outro termo para o traduzir, pois é a mesma função pelas investigações que fiz).
 
E, bem baixinho aos meus ouvidos, dizia-me “ali é que mora NKassa; ele vive ali. É sempre presente nas nossas vidas.
 
Olhava, perscrutava, mas não via o defunto fundador da jorson dos Bossudrsu.
Falava-me ainda da doença do fogo, isto é, da lepra (Mackuróô).
 
Dissertava ela que o fogo penetrava em tudo. Coze alimentos. Faz transformações. Gera mundos e mundividências.
 
O fogo castiga.
 
O fogo julga.
 
E o povo?
 
Este, sim, fustiga!
 
O fogo amigo corroeu-nos a esperança. Destruiu a nossa fé no homem: aquele que prometera ser o melhor Chefe do mundo. Porém, acabou por transformar-se no Chefe da quadrilha mais poderosa do mundo.
 
Deixou-se levar pela avareza acumulando mais dinheiro, pois o seu grande irã prometera-lhe a pátria de NKanande, de Cabral, de Nino por herança. E, para isso, cercou-se dos melhores filhos da terra, Os sim senhor, a gosto do freguês.
  1. As cores
4.1. A cor vermelha simboliza o sangue, o martírio, a resistência e a coragem, a força, o sacrifício, a missão, o ardor.

 Ela está ligada ao fogo das paixões, ao amor carnal e espiritual, à caridade, mas também vincula-nos à guerra, que visa subverter a ordem caótica.
 
Na terra, dizia a minha avó, o site (óleo de palma) simboliza o fogo. Porque penetra até o mais íntimo da carne e do corpo. Ele isola, conserva intato o corpo contra tudo quanto é profano, e impuro.
 
Simboliza, em suma, o sangue que nada mais é do que a VIDA.
 
Urge darmos vida à pátria, afugentando os delinquentes, e o seu cínico Chefe, o mais mentiroso que uma vez se registou na História nacional.
 
4.2. A cor branca, a cor da glória, da majestade, da alegria, da inocência, da imortalidade. Ou seja, a cor-base da vida.
 
A cor do leite que mamamos. A cor do líquido que expelimos no ato sexual para gerarmos a vida. Mas isso não foi minha avó que mo ensinou, não.
 
Não devemos deixar, e nem permitir com que venham a secar o pote da pátria.
Eis o significado do Livro da Palavra:
 
Purificar nossas consciências de toda e qualquer mancha do mal.
 
É preciso ter a sede interior da verdade da paz que, na graça divina de Deus, renova e recria os nossos corações.
 
À guisa da conclusão, para dizer apenas que, em tempos de ideologia da mediocridade, as ukassas do Irã de Fanado de Thor foram apreendidas pela Polícia de Quinhamel. Aqui é o único país do mundo onde politiqueiros mantêm presos defuntos com os seus respectivos símbolos religiosos.
 
Hoje, já na casa dos 40 anos de idade, só posso admoestar os de sempre, dizendo-lhes o seguinte:
 
Tenham paciência homens reles!
 
No tempo do Antigamente os régulos eram regrados, mas hoje associam-se a políticos de índole duvidosa para externarem na Praça Pública os segredos dos nossos deuses, dos nossos defuntos, dos nossos antepassados, e dos nossos irãs.
 
Caro leitor d’O Democrata, até a próxima, que o cronista precisa dormir para tentar esquecer o desassossego pátrio.
 
 
Por: Jorge Otinta, poeta e crítico literário guineense.
Bissau – NTIN -, 11 de abril de 2017

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Samuel

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