A contracção de 1,7%, anunciada recentemente pelas autoridades estatísticas angolanas (INE), “é mais um resultado terrível, apesar de ser um pouco menos mau” do que a previsão da Capital Economics, que antecipava uma queda do Produto Interno Bruto de 2,5% em 2018, diz John Ashbourne, analista que acompanha a economia de Angola na consultora Capital Economics.
Comentando os mais recentes números, John Ashbourne vincou que apesar de não ter acertado na previsão da queda do PIB, o resultado “sustenta a nossa visão de que a opinião de consenso dos analistas sobre a economia angolana ainda é, de longe, demasiado optimista”.
Lembrando que, “tão recentemente como em Outubro, o Fundo Monetário Internacional (FMI) ainda estava a projectar que o PIB ficasse basicamente estagnado em 2018”, John Ashbourne afirmou que “a economia deverá enfrentar um novo ano atribulado em 2019” e apontou para uma previsão de “recessão de 1%, que contrasta com a expectativa do consenso [dos analistas] de uma subida de 0,6%”.
Na semana passada, o Instituto Nacional de Estatística (INE) de Angola revelou que a economia tinha caído 1,7% no ano passado, mas avisou que este valor “poderá sofrer alterações” quando foram publicados os resultados finais das Contas Nacionais.
Esta contracção corresponde às previsões do FMI, divulgadas em Dezembro de 2018 e surge depois de PIB – toda a riqueza produzida no país – angolano ter já registado uma recessão de 0,2% em 2017.
No documento, o INE refere que o PIB angolano cresceu 2,2% durante o quarto trimestre de 2018 face ao período homólogo de 2017, um crescimento que não conseguiu impedir a recessão de 1,7% no acumulado do ano.
De acordo com o Relatório de Fundamentação do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2019, o Governo estima que o crescimento do PIB face a 2018 se situe entre os 2,3% e os 2,8%.
O que dizem os de casa
Odepartamento de estudos económicos do Banco Fomento Angola (BFA) alerta para a possibilidade de os investimentos em infra-estruturas em Angola serem adiados se for necessária maior consolidação orçamental, mas elogia o programa do FMI no país.
“O programa do Fundo Monetário Internacional (FMI) que foi acordado parece-nos, em geral, moderado e bem desenhado; não assume esforços orçamentais desmesurados (a grande parte da consolidação orçamental ocorreu já por iniciativa do Governo em 2018), e não prevê crescimentos nominais absurdos para justificar a descida da dívida em percentagem do PIB”, escreveram os analistas.
“Como aspecto negativo, destacamos a não-existência de uma maior atenção à questão das infra-estruturas logísticas do país, ainda que esses investimentos estejam previstos”, acrescentam, vincando que receiam que, “no caso de necessidades de maior consolidação orçamental, os investimentos necessários sejam novamente adiados”.
No documento de análise ao Programa de Financiamento Ampliado acordado entre Angola e o FMI em Dezembro, os analistas do BFA dizem que o alinhamento com apoios concretos de outras instituições internacionais “leva a crer que, no caso de haver uma necessidade adicional por circunstâncias que fogem ao controlo do executivo angolano, como por exemplo o preço do petróleo, o FMI terá mais facilidade em justificar um apoio extraordinário”.
Recorde-se que o acordo assinado prevê uma ajuda financeira de 3,7 mil milhões de dólares, tendo quase mil milhões sido entregues ao Governo ainda em Dezembro para fazer face às necessidades de liquidez imediata, nomeadamente para pagar dívidas atrasadas a fornecedores.
Os economistas do BFA alertam, no entanto, que “o sucesso do programa, em dar sustentabilidade ao crescimento económico, dependerá sempre de alguns factores exógenos”, e apontam que o preço do petróleo, a principal exportação de Angola, será fundamental para “determinar a folga orçamental que o Governo terá para conseguir fazer os investimentos necessários em infra-estruturas e/ou assegurar gastos sociais para suavizar o impacto de algumas medidas, como a retirada dos subsídios”.
A chave para o sucesso, concluem, “estará na capacidade de transformar o melhor ambiente de negócios em investimentos concretizados, em particular investimentos estruturantes, que possam servir de chamariz para outros empresários”, pelo que o programa do FMI acaba por ser “uma excelente janela de oportunidade para Angola, um período histórico de alinhamento do país com múltiplas organizações internacionais (a cujo início do combate à corrupção não é alheio) que poderá permitir as condições certas para uma mudança lenta, mas efectiva, que resulte numa menor dependência do petróleo”.
Relembre-se que, por ordem do FMI, o Presidente João Lourenço cancelou a autorização dada em Janeiro para a aquisição de novos aviões para a TAAG, alegando a necessidade de se proceder a um “estudo mais aprofundado” no Plano de Reestruturação da companhia aérea de Angola.
O Conselho Executivo do FMI aprovou o Programa de Financiamento Ampliado (Extended Fund Facility – EFF), que visa apoiar as reformas económicas em curso em Angola nos próximos três anos, tendo como base o Programa de Estabilização Macroeconómica (PEM) e o Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) 2018-2022.
“O EFF pretende, assim, apoiar os esforços de melhoria da governação, reduzir os riscos associados às empresas estatais, corrigir os obstáculos estruturais à competitividade e melhorar o acesso ao financiamento, aspectos que, entre outros, são considerados fundamentais para acelerar o crescimento económico liderado pelo sector privado”, sublinho o comunicado de imprensa então distribuído-
Segundo o Ministério das Finanças, o programa acordado entre Angola e o FMI ajudará também o país a “restaurar a sustentabilidade fiscal e externa” e “lançará as bases para uma diversificação económica sustentável”.
“Os pilares críticos do programa incluem a consolidação fiscal para levar a dívida a níveis mais seguros, uma maior flexibilidade da taxa de câmbio para recuperar a competitividade e o apoio à política monetária para reduzir a inflação”, lê-se no texto.
Outros pilares do programa incluem o fortalecimento do sistema bancário, “permitindo melhorar o ambiente de negócios”, assim como actualizar o quadro legal do combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo.
Angola fechou 2018 com uma inflação anual de 18,6%, seis décimas acima da última previsão do Governo (18%). Os números já incorporam os dados do Índice de Preços no Consumidor (IPC) de Dezembro, que foi de 1,41%, acima dos 1,31% de Novembro.
Joana Pedro, técnica do Departamento de Estatísticas Financeiras do INE, indicou que, em Dezembro de 2018, a maior taxa de inflação nas províncias registou-se no Bengo (2,2%) e a menor no Huambo (1,14%).
Assim, a inflação no acumulado de 12 meses passou de 18,04%, em Outubro e 18,36%, em Novembro, para os 18,6% finais (em Dezembro), e afastando-se dos 18% previstos pelo Governo (Janeiro a Dezembro), conforme revisão inscrita em Outubro último no Orçamento Geral do Estado para 2019. Antes desta revisão em baixa, o Executivo previa uma inflação de 28,8% para todo o ano de 2018.
A responsável do INE salientou que, das 18 províncias, em Dezembro, dez ficaram abaixo da média nacional (1,41%), com a de Luanda a atingir 1,51%, menos 0,12 pontos percentuais que em relação a Novembro do mesmo ano.
Estes números, acrescentou, devem-se ao agravar dos preços, em termos nacionais, nas classes da Alimentação e Bebidas Não Alcoólicas (2,3%), Bens e Serviços (2,6%), Vestuário (2,01%) e Alimentação (1,53%).
Em 2016, a inflação em Angola (12 meses) chegou a 41,12% e no ano seguinte desceu para 23,67%.
Folha 8 com Lusa