Ativista angolano vê a exoneração como o início do fim dos negócios da "eterna filha" do antigo Presidente. Rafael Marques pede ainda que se faça justiça em relação aos "amigos de ocasião" que saquearam Angola.
fonte: DW África
A filha de José Eduardo dos Santos, antigo Chefe de Estado de Angola, esteve sempre na mira dos populares e investigadores por ocupar a liderança da maior empresa pública do país e por se apoderar da maioria dos negócios à custa do pai. Sobre este assunto conversámos com o jornalista e ativista dos direitos humanos Rafael Marques, um dos maiores críticos angolanos de Isabel dos Santos.
DW África: Rafael Marques foi uma das pessoas que mais contestou a atuação de Isabel dos Santos na vida pública de Angola. Como vê a sua exoneração enquanto Presidente do Conselho de Administração da Sonangol?
Rafael Marques (RM): Isabel dos Santos não tinha competência para dirigir a Sonangol. Quem conhece bem a Isabel sabe que foi um disparate autêntico do pai dela colocá-la naquela posição. Por outro lado, quem conhece bem Angola, sabe que a Isabel estava ali para proteger os seus negócios e interesses e para ter uma cobertura política para se impor a nível internacional. A Isabel teve lucros de seis milhões em dois anos em Portugal. Esse dinheiro é o que ela gasta nas suas viagens. Portanto, tinha de ter acesso sem impedimentos aos recursos do Estado e pensou fazê-lo através da Sonangol. Como é que uma pessoa que se crê uma gestora séria foi dirigir a maior empresa do país a partir de Londres e com base em consultores portugueses que não percebem nada de petróleos? Ela não foi para aquela empresa para reformar a companhia ou para potenciar os seus técnicos. Foi praticamente para pegar na Sonangol e usá-la em seu interesse privado.
A saída dela levanta outros problemas. Alguns dos novos membros nomeados para o Conselho de Administração são indivíduos que também estiveram ligados aos esquemas de corrupção na Sonangol. Continuaremos a falar sobre isto até que haja efetivamente transparência e boa governação em Angola, para que o povo angolano possa beneficiar dos recursos que o país tem.
DW África: Fala-se, ao nível internacional, numa possível perda de influência de Isabel dos Santos. Vê a situação da mesma forma?
RM: A Isabel dos Santos, agora sem a Sonangol, está acabada, porque todos os portugueses que a apoiavam e que faziam as suas relações públicas, e inclusivamente a imprensa, surgiam em função do poder que ela derivava do seu pai. Sem isto a Isabel não vai conseguir manter os seus negócios, porque são negócios que foram sempre mamar do Estado e que não obedecem a critérios de boa gestão. São negócios que se tornaram sorvedores dos fundos públicos em Angola.
Ela criou um supermercado em Angola, o Candando. Como é que ela ia buscar os lucros neste negócio? Na Sonangol. Obrigava os trabalhadores a fazerem compras no seu supermercado e retirava os fundos da Sonangol. Com estas mudanças, este supermercado não terá como obter lucros. Por outro lado, vai ter de prestar contas sobre muitos fundos que ela se aboletou, incluindo aqueles que eram para a Portugal Telecom, uma das sócias da UNITEL.
A partir daqui, a Isabel só vai ter problemas. Vão começar também agora os problemas judiciais e as investigações em vários pontos do mundo, porque ela já não tem poder nenhum. É isso que ela ainda não percebeu. Os amigos que ela arranjou eram amigos de ocasião, eram apenas mercenários para saquearem Angola. No momento em que ela já não tiver nada para lhes dar, vão deitá-la abaixo.
DW África: Mais do que a exoneração de Isabel dos Santos, muitos angolanos consideram que ela e o pai deveriam ser levados à Justiça. Considera que há interesse do lado do Governo e do MPLA em colaborar para que isto aconteça?
RM: Deve haver uma séria investigação sobre este período em que ela esteve na Sonangol, porque tivemos gestores estrangeiros que a ajudaram a tornar a Sonangol ainda mais opaca. São indivíduos que têm de prestar contas, como o Sarju Raikundalia, o Mário Leite Silva que continua como presidente do Conselho de Administração do Banco de Fomento de Angola (BFA) e outros gestores que ela foi contratar a Portugal e noutros países.
É importante que haja justiça. Para que essa investigação possa correr, o Presidente tem de se desfazer logo do Procurador-Geral da República, o general João Maria de Sousa, que é um homem que deu sempre cobertura aos atos de grande corrupção em Angola.
DW África: João Lourenço está a tomar medidas há muito esperadas pelos angolanos. Será isso só fogo de palha ou pode esperar-se muito mais do novo Presidente?
RM: Até ao momento, o que João Lourenço está a fazer é nomear e exonerar, portanto está a criar a sua equipa. Isto é aquilo que qualquer novo Presidente faz. Não há nada de extraordinário. O que é extraordinário é que efetivamente João Lourenço está amostrar que o Presidente da República é ele e não o MPLA.
Neste momento, ele está a tomar as medidas que se impõem em termos de reformulação e administração do Governo. Mas nós precisamos de reformas profundas e é aqui que vamos acompanhar com cautela que reformas serão essas.
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Samuel