PGR portuguesa "não deixará" de "desencadear os procedimentos adequados no âmbito das suas atribuições". Para analista, "Justiça portuguesa não tem fundamentos para não avançar". Banca afasta-se da empresária angolana.
A Justiça portuguesa segue com atenção as investigações sobre o envolvimento da empresária angolana Isabel dos Santos em operações ilícitas de branqueamento de capitais.
O Ministério Público (MP) português, através de uma nota de imprensa dirigida à DW África, assegurou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) portuguesa "não deixará de analisar toda a informação que tem vindo a público e de desencadear os procedimentos adequados no âmbito das suas atribuições", na sequência das revelações do "Luanda Leaks".
O MP acrescentou que mantém uma estreita colaboração com a sua congénere angolana - depois da renovação, em abril de 2019, do acordo adicional de cooperação neste domínio.
A nota precisa ainda que "a Procuradoria-Geral da República dará seguimento aos pedidos de cooperação judiciária internacional que lhe sejam dirigidos pelas autoridades angolanas".
O essencial, segundo o jurista português Rui Verde, é que Isabel dos Santos perdeu toda a credibilidade, enquanto empresária.
"Não considerando eventuais processos-crimes, investigações e condenações judiciais, o ponto essencial é que, neste momento, Isabel dos Santos terá dificuldades em levantar dinheiro na banca, em obter crédito. Todos os bancos, todas as instituições, neste momento, se retrairão. E esta é uma primeira implicação para Portugal: onde apareceu o nome de Isabel dos Santos, neste momento, haverá uma fuga", avalia.
Para este professor de Direito ligado à Universidade de Oxford, "não é uma questão judicial, nem sequer é uma questão política. É uma mera questão comercial, mas que terá mais impacto que as questões judiciais e políticas".
Desconforto no mercado
A engenheira angolana, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos com a cidadã russa Tatiana Kukanova, detém participações em 17 empresas portuguesas - destacando-se os setores da Energia (Galp e Efacec), telecomunicações (NOS Comunicações) e banca (EuroBic).
Na mega-investigação "Luanda Leaks", Isabel dos Santos é apontada como estando envolta num esquema de desvio de mais de 100 milhões de euros da Sonangol para o Dubai.
As notícias vieram a público esta segunda-feira (20.01) com impacto na Bolsa de Valores. A empresária está a ser pressionada para sair do EuroBic, banco português onde tem uma participação de 42,5% - adquiridos do antigo Banco Português de Negócios (BPN).
O EuroBic manifesta desconforto e anunciou, em comunicado, que cortou relações comerciais com as empresas controladas pela esposa do milionário congolês, Sindika Dokolo.
O banco português já pediu a realização imediata de uma auditoria às operações de pagamentos de pelo menos 115 milhões de euros ordenados pela cliente Sonangol, em 2017, à favor da Matter Business Solution DMCC, no Dubai. E compromete-se a enviar para o Banco de Portugal todos os documentos relativos a tais transferências.
Em entrevista recente à DW-África, a ex-eurodeputada portuguesa, Ana Gomes, apontou o dedo ao banco EuroBic, acusado de ser usado para lavagem de capital e, sem a veleidade de substituir o papel da Justiça, denunciara o envolvimento de portugueses em atos de corrupção em Angola.
"Isto não pode ser a base do relacionamento entre Portugal e Angola", afirmou.
"Não me venham dizer que é bom que nós fechemos os olhos à corrupção em Angola e à forma organizada como alguns aqui em Portugal ajudam os corruptores em Angola. Mais tarde ou mais cedo, haverá quem em Angola peça responsabilidades como deve ser a Portugal também e aí não são só os empresários, os advogados e os cúmplices dos angolanos que serão co-responsáveis, serão também os poderes políticos - se dá a respaldo à continuação desse tipo de relacionamento", criticou a ex-eurodeputada portuguesa.
EuroBic sob avaliação
Por sua vez, o Banco de Portugal quer uma alteração da estrutura acionista do EuroBic, depois de reafirmar à DW África que Isabel dos Santos perdeu o lugar que tinha no conselho da administração, "não tendo qualquer outra participação social em qualquer outra instituição financeira supervisionada pelo regulador".
No seu comunicado desta segunda-feira (20.01.), a instituição dá conta que "pediu ao EuroBic informação que permita avaliar o modo como a referida instituição analisou e deu cumprimento aos deveres a que está sujeita, em matéria de prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo".
E acrescenta que, "em função da avaliação da informação recebida, o Banco de Portugal retirará as devidas consequências, nomeadamente em matéria prudencial e contra-ordenacional".
Depois das investigações ao abrigo do "Luanda Leaks", o supervisor criou um grupo de trabalho com foco na situação no EuroBic e já pediu mais informações sobre as operações de transferência para o Dubai, com recurso aos dinheiros da Sonangol. No comunicado assinado pelo governador Carlos Costa, o Banco de Portugal admite aplicar multas ao banco dirigido por Teixeira dos Santos, depois de avaliar tais informações.
Justiça X "prudência"
A propósito dos efeitos diretos e indiretos do "Luanda Leaks” em Portugal, Rui Verde fala de um segundo problema para a banca portuguesa, relacionado sobretudo com os empréstimos da Caixa Geral dos Depósitos a Isabel dos Santos, contraídos para comprar ações da Efacec e da NOS Comunicações.
"A questão não está exatamente nos empréstimos em si mesmos. Está na capacidade que ela terá ou não, a título pessoal, para pagar o capital e os juros desses empréstimos. Aliado a isto, que garantias Isabel dos Santos terá dado pessoalmente para obter estes empréstimos", pondera.
Entretanto, o jurista português entende que, neste momento, a Justiça portuguesa não tem fundamentos para não avançar com investigações mais aprofundadas sobre branqueamentos de capital em Portugal, independentemente de qualquer iniciativa por parte da Justiça angolana.
"Mas, talvez, a prudência aconselhe a esperar pela posição da Justiça angolana antes de Portugal avançar, atendendo ao impacto nas relações exteriores que estas investigações sempre têm", considera.
No plano criminal, Rui Verde crê que "o ponto" a considerar deverá ser o de branqueamento de capitais e acredita, entretanto, que as instituições portuguesas estarão à espera da tomada de posição por parte das congéneres angolanas ou de outros países onde também decorrem investigações.
Portugal é o país onde "a mulher mais rica de África" detém mais ativos, desde 2005, atualmente com 142 participações empresariais. Além do EuroBic, há mais empresas e instituições portuguesas preocupadas com a reputação de Isabel dos Santos, as quais estão já a distanciar-se da empresária angolana, que disse ter saído de Angola por perseguição à sua família. A filha primogénita de José Eduardo dos Santos promete combater a polémica nos tribunais internacionais.
QUEM SÃO AS MULHERES MAIS PODEROSAS DE ÁFRICA?
Primeira mulher Presidente em África
Ellen Johnson Sirleaf foi a primeira mulher eleita democraticamente num país africano. De 2006 a 2018, governou a Libéria, lutando contra o desemprego, a dívida pública e a epidemia do ébola. Em 2011, ganhou o Prémio Nobel da Paz por lutar pela segurança e direitos das mulheres. Atualmente, lidera o Painel de Alto Nível da ONU sobre Migração em África.
FONTE: DW ÁFRICA
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Samuel