A saúde de Nelson Mandela, melhorou um pouco esta quinta feira (27.06), porém o ex-presidente da África do Sul, permanece num estado crítico no vigésimo dia da sua hospitalização.
Apesar desta evolução, a família evocou publicamente, pela primeira vez, a perspectiva do falecimento de Madiba a qualquer momento. Na quarta feira à noite, o presidente sul-africano, Jacob Zuma, anunciou a anulação da sua viagem a Moçambique, para a cimeira da SADC, Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, devido à deterioração do estado de saúde de Mandela.
Entretanto, analistas começam a alertar para o risco de violência e um aumento da visibilidade de tensões sociais na África do Sul após a morte do líder histório do ANC, Congresso Nacional Africano. A DW África, entrevistou André Thomashausen, analista político e Professor de Direito Internacional na UNISA-Universidade da África do Sul, em Joanesburgo.
DW África - Existe uma possibilidade real de se verificarem erupções de violência popular após a morte de Nelson Mandela?
André Thomashausen (AT) – Sempre quando acontece na história de um país uma ruptura, algo com um significado e de dimensão psicológica fundamental, existe essa possibilidade de que grupos minoritários ou grupos extremistas possam tentar aproveitar esse momento, em que talvez a história do povo parece estar parada, para provocar perturbações. No caso concreto da África do Sul, existe um certaoalerta, nomeadamente foram mobilizadas forças na reserva para qualquer eventualidade e é possível, como existe uma vaga global de contestações populares, na Turquia, no Egito, no Brasil, é possível que também aqui este possa ser o momento em que descontentamentos populares venham a se fazer sentir.
DW África - Isso quer dizer que as tensões sociais e políticas na África do Sul serão mais visíveis após a morte de Mandela?
AT - De certeza, porque Mandela é o símbolo da unidade nacional, ele é o símbolo da identidade moderna e nova deste país no sentido inteiramente positivo, ou seja, um país não violento, virado para a justiça social e para o progresso. E é por isso que o mundo tem visto sempre a África do Sul com um certo carinho e tem a acolhido muito bem. Só que nos últimos dez anos, essa visão está cada vez mais difícil de se atingir. As diferenças sociais são enormes, o fosso entre os mais pobres e os mais ricos é grande e portanto essa clivagem muita aguda nesta sociedade terá que ser remediada.
DW África - Mas isso não significa que a herança de Mandela será posta em causa?
AT- Mandela vai deixar este país já numa fase de crise, embora não seja uma crise pela qual possa ser responsabilizado. A África do Sul, tal como muitos outros países semi-industrializados e os industrializados que estão em crise atualmente, não foge à essa regra, só que a África do Sul é mais vulnerável porque não se integra por exemplo numa união forte como a União Europeia, que pode sempre aguentar, assistir e equilibrar as situações. A África do Sul encontra-se só e muito vulnerável.
DW África - Será que as comunidades de estrangeiros residentes na África do Sul correm algum perigo no que concerne ao futuro ?
AT- Neste momento, as emoções e críticas são dirigidas contra os imigrantes ou os refugiados económicos dos países vizinhos. A África do Sul acolhe atualmente cerca de três milhões de cidadãos do Zimbabwe devido à crise já quase permanente naquele país, mas também temos números muito expressivos de outras partes de África em crise, inclusive de países já muito afastados como a Somália. Esses refugiados têm sentido na pele actos de xenofobia, com ataques e espancamentos, lojas queimadas, etc. O sentimento popular é de responsabilizar os refugiados, os estrangeiros africanos pelas carências e dificuldades que uma grande parte da população está a enfrentar.
DW África - Mas os sul-africanos brancos devem temer o futuro com a morte de Nelson Mandela?
AT- Por enquanto não há nenhuma indicação que isso venha a acontecer. A percepção popular é de que a situação se mantem pacífica com a economia a funcionar, os postos de trabalho ainda existem e a funcionar precisamente por causa dos brancos. Não existe animosidade contra os brancos, nem mesmo contra os antigos opressores, os brancos de origem holandesa os “boers”, mas sim existem ressentimentos e agressividade contra os emigrantes de outros países africanos. Isto porque a população aqui acha que essas pessoas estão a tirar-lhe a possibilidade de trabalhar, a oferecer a sua mão de obra ao desbarato, e principalmente a afetar as condições dos serviços sociais, as disponibilidades nos hospitais nas escolas e nos serviços de transportes, para além de contribuírem para aumentar a criminalidade no país. Neste ponto sim, haverá um perigo, contudo não penso que as várias comunidades de origem europeia que vivem neste país sejam atingidas.
fonte: DW
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Samuel