O líder da UNITA, fazendo eco do sentimento generalizado dos militantes e simpatizantes do seu partido, lamentou que o Estado angolano (MPLA) continue a reter os restos mortais de Jonas Savimbi, morto em 2002, facto que Isaías Samakuva disse constituir “um testemunho gritante da política de exclusão entre irmãos”. Isto, é claro, no ingénuo pressuposto de que o MPLA considera irmãos todos os que não militam nas suas fileiras.
Numa intervenção pública em Viana, destinada a assinalar que, se fosse vivo, Jonas Savimbi, primeiro presidente e fundador da União Nacional da Independência Total de Angola (UNITA), teria feito na sexta-feira 84 anos, Isaías Samakuva acrescentou que a atitude do MPLA (partido que governa o país desde 1975) “simboliza a necessidade imperativa da genuína reconciliação nacional”.
“A prisão dos restos mortais do co-fundador da República de Angola constitui um testemunho gritante da política de exclusão entre irmãos e simboliza a necessidade imperativa da genuína reconciliação nacional, que a República ainda luta contra si própria e que os angolanos ainda não são um só povo, uma só Nação”, sublinhou Isaías Samakuva.
“Não há razão alguma para que o Estado angolano mantenha Jonas Malheiro Savimbi preso mesmo depois de morto. Porque é que os restos mortais de Jonas Savimbi foram capturados pelo Estado angolano? Porque é que se prende um morto”, questionou.
Jonas Savimbi nasceu a 3 de agosto de 1934, no Munhango, uma vila situada ao longo do Caminho de Ferro de Benguela. Filho de Loth Malheiro Savimbi e de Helena Mbundo Sakato Savimbi.
O Líder histórico da UNITA viria a ser morto em combate após uma perseguição das forças armadas angolanas (com o vital apoio de alguns ex-generais das FALA , entre os quais Geraldo Sachipengo Nunda) a 22 de Fevereiro de 2002 próximo de Lucusse, na província do Moxico, onde os seus restos mortais permanecem sepultados, à guarda do Estado angolano.
Para Isaías Samakuva, há que “ultrapassar” a situação e criar uma “nova atitude” perante a Pátria e perante o futuro, uma vez que, disse, uma “Angola unida e reconciliada será mais forte, mais legítima e mais rica”.
Nesse sentido, o líder da UNITA apelou ao Presidente angolano, general João Lourenço, para “capitalizar o momento histórico” e “potenciar as pontes de diálogo” para um novo pacto social “que conduza a uma efectiva reconciliação nacional”.
“Hoje, 50 anos depois, não devemos nunca mais perder de vista o essencial. O essencial é reconhecermos que todos os povos tiveram as suas guerras fratricidas e que não há guerra que não destrua. O essencial é reconhecer que, em todas essas guerras de irmãos, em todos os conflitos de família, não há apenas um único culpado. Das nossas guerras e destruições, dos futuros mutilados e dos sonhos destruídos, culpados somos todos, responsáveis somos todos e vítimas somos todos”, frisou.
Para Isaías Samakuva, a luta pela construção do país só será bem-sucedida se todos a fizerem com “patriotismo, sentido de nação plural e grandeza moral”.
Segundo o responsável máximo da UNITA, “não há razão alguma que justifique” que os feitos históricos de Jonas Savimbi, reconhecidos por África e pelo mundo, “não sejam reconhecidos formalmente pelo Estado angolano que ele próprio ajudou a erigir e do qual é co-fundador”.
“Savimbi foi um homem culto, abnegado e destemido, que marcou de forma decisiva e inapagável o curso da História política de Angola e da África Austral. Amado por muitos, odiado por outros, mas respeitado por todos, Savimbi deixou-nos um legado que devemos estudar”, sublinhou.
“Honrar hoje a memória de Jonas Malheiro Savimbi significa estabelecer imediatamente as autarquias locais. Significa fiscalizar e auditar a dívida pública, reduzir a inflação, parar com os roubos e com a impunidade daqueles que utilizam o Estado para se governarem a si próprios”, defendeu.
Para Isaías Samakuva, honrar Savimbi significa também “transformar radicalmente” os sistemas de educação, de saúde e nacional de segurança social, canalizar os investimentos produtivos para o interior do país, “parar o crescimento anárquico” de Luanda e promover a criação de cidades ecológicas, economicamente sustentáveis.
“O maior legado de Jonas Malheiro Savimbi é sem dúvida a conquista da nacionalidade angolana para todos os povos de Angola”, concluiu.
Se o MLA é Angola…
Recorde-se que João Lourenço, na altura ostentando o rótulo de candidato mas já com o resultado eleitoral no bolso, deslocou-se à província do Bié para um acto político e, perante milhares de pessoas (são sempre milhares e milhares), disse: “A nossa bandeira é bastante conhecida, ninguém pode dizer que não conhece a nossa bandeira, num desses comícios, a brincar, eu dizia que a nossa bandeira é mais conhecida que a Coca-Cola”. E é verdade. A bandeira nacional angolana é uma réplica da bandeira do MPLA.
No seu discurso, o agora Presidente de todos os angolanos… do MPLA, referiu-se igualmente ao passado histórico da província do Bié, fortemente atingida no período de guerra civil, considerando que a mesma “deveria passar para a história como a cidade do perdão”. Perdão que o regime de João Lourenço confunde com submissão, rendição, esclavagismo.
Para João Lourenço, a província do Bié e a sua capital, Cuito, são a “cidade do perdão, da tolerância”, por terem sabido “perdoar, serem tolerantes ao ponto de terem contribuído bastante para que a reconciliação nacional entre os angolanos vingasse”.
Reconciliação? Essa só contaram para João Lourenço que, como ministro da Defesa, deu o exemplo de que o mais importante para o regime é a razão da força e não a força da razão. Reconciliação pela força é como acontecia durante o colonialismo português, em que os chefes do posto apresentavam à sociedade os “voluntários devidamente amarrados”.
João Lourenço pediu o voto do povo do Bié, para acabar com a fome, pobreza e a miséria, que ainda grassa por algumas regiões do país, reactivando a agricultura e a indústria, prometendo milhares e milhares de empregos para a juventude. Isto é, o MPLA promete fazer agora o que o MPLA não fez durante 42 anos.
Sem citar nomes, deixando a identificação para os militantes, João Lourenço recordou que o país já teve num passado recente um potencial de indústrias, no entanto, destruídas em tempo de guerra. Guerra em que, como todos sabemos, só as balas, as bombas, as minas da UNITA matavam o Povo. As do MPLA, inteligentes, paravam e perguntavam: és Povo? Se era… elas desviavam.
“Vamos repor as indústrias, não só para que voltemos a produzir os bens industriais, mas sobretudo para resolvermos um problema, que é o emprego. Aqueles que destruíram a indústria e, consequentemente, destruíram os postos de trabalho que a indústria oferecia são os mesmos que hoje vêm dizer que a juventude não tem emprego”, acusou aquele que hoje é Presidente da República e que, em breve, será igualmente Presidente do MPLA.
Ora aí está. A culpa só pode ser daqueles que destruíram tudo e mataram quase todos. A UNITA, é claro. Aliás, um dia destes ainda se provará que os massacres do 27 de Maio de 1977 foram levados a cabo pela UNITA sob comando de Jonas Savimbi. Mais atrasado está o dossier em que o MPLA trabalha para provar que Savimbi também foi responsável pelo holocausto nazi.
“Hoje com maior descaramento vêm dizer que a juventude não tem emprego. Vamos criar milhares de postos de trabalho para a nossa juventude. Os que destruíram os postos de trabalho vão ser penalizados e duramente penalizados (…) vamos castigá-los no voto, é a melhor forma de os castigar”, frisou João Lourenço que, pelos vistos, nada tem a ver com o passado do MPLA pois, asseguram-nos fontes do regime, só ontem (ou terá sido hoje?) chegou a Angola.
Folha 8 com Lusa
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Samuel