"A pandemia teve impactos vários nas nossas vidas, sobretudo em relação a meninas e jovens mulheres, não só nos casos de mutilação genital feminina, mas também nos casamentos forçados e violência contra mulheres", afirmou Fatumata Djau Baldé, do Comité Nacional para o Abandono das Práticas Tradicionais Nefastas à Saúde da Mulher e da Criança da Guiné-Bissau.
A mesma opinião é partilhada por Laudolino Medina, da Associação Amigos da Criança, e com uma vasta experiência de apoio a meninas que fogem ao casamento forçado. "Com a Covid-19, as famílias que vivem do quotidiano viram os seus rendimentos cair e as estratégias mudam, nomeadamente através do casamento forçado com um elevado dote", afirmou Laudolino Medina. "O que é igual a vender crianças e a torná-las num objeto comercial", salientou.
Os primeiros casos de covid-19 na Guiné-Bissau foram confirmados a 25 de março de 2020. Desde então, o país, com cerca de dois milhões de habitantes, regista mais de 3.500 casos acumulados e 55 vítimas mortais. Há um ano, as autoridades guineenses declararam o estado de emergência, que esteve em vigor até setembro, e foi imposto um confinamento geral à população, que inicialmente só estava autorizada a circular entre 07:00 e as 11:00.
Aumento de casamentos forçados
Segundo Laudolino Medina, tradicionalmente na Guiné-Bissau há dois períodos em que se regista um aumento do casamento forçado, quando começa o jejum dos muçulmanos e a época das colheitas agrícolas. "Agora, com a pandemia, o fenómeno tornou-se frequente e praticamente todas as semanas recebemos meninas. Umas vêm referenciadas pelas autoridades e outras aparecem pelos próprios pés", disse.
Laudolino Medina explicou também que as meninas que aparecem na associação são provenientes das regiões norte, sul e leste do país e algumas do Setor Autónomo de Bissau.
"O confinamento fez aglomerar mais pessoas em casa e com as dificuldades do dia-a-dia. Os familiares tiveram mais condições para fazer outras práticas como a mutilação genital feminina", disse Fatumata Djau Baldé.
Segundo a ativista, há informação de um aumento da mutilação genital feminina no país, mas ninguém denuncia, principalmente na região de Gabu.
Mas, para Fatumata Djau Baldé, a luta para o abandono das práticas nefastas "não tem sido uma prioridade dos sucessivos governos" na Guiné-Bissau. "É preciso fazer uma leitura científica entre a taxa de mortalidade materna e infantil" e as práticas nefastas, disse, lamentando que isso apenas será feito quando o Governo perceber que abolir aqueles comportamentos é uma "causa nacional".
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) advertiu no início de março que mais 10 milhões de casamentos infantis podem ocorrer antes do final da década. A pandemia, que provocou o encerramento de escolas, dificuldades económicas, interrupções nos serviços de acesso à saúde e a morte de pais, está a colocar as meninas em situação mais vulnerável e a correr um maior risco de fazerem um casamento precoce.
A Guiné-Bissau registou mais de 3.500 casos de infeção pelo novo coronavírus e 55 vítimas mortais associadas à covid-19, desde o início da pandemia no país, a 25 de março de 2020.
fonte: DW África
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Samuel