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segunda-feira, 23 de novembro de 2015

GUINÉ-BISSAU: RAMIRO NAKA RECOMENDA NOVA GERAÇÃO A APOSTAREM NA MÚSICA TRADICIONAL PARA CONQUISTAR O MERCADO.

NO BALUR I STA NA NO KUNCIMENTI, PA KILA, NO BALURIZA KUNCIMENTI!...

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O conceituado músico internacional, Ramiro Naka, pediu aos jovens artistas da nova geração a apostarem na música tradicional para assim conquistarem o mercado internacional. O cantor pediu igualmente aos jovens no sentido de se organizarem em grupo através de orquestras e tentar tirar o proveito da cultura guineense.
Durante a entrevista concedido a’O Democrata o cantor, que outrora fora considerado o rosto da cultura da Guiné-Bissau, contou a sua visão sobre a música guineense, comparou as gerações de músicos e revelou a história do seu percurso na vida, além da música, dos desafios que enfrentara .
Lembrou que praticara o atletismo só para conseguir um lugar onde pudesse ganhar algo para comer, porque ao mesmo tempo que corria para os leões de Portugal, a noite ia sempre tocar nas discotecas. O artista falou dos seus primeiros momentos no conceituado grupo musical “N´Kassa Cobra”, bem como dos momentos difíceis e menos bons.
Ramiro Naka defendeu que não se pode esperar muita coisa do Estado para desenvolver a Cultura guineense, visto que o próprio Estado depara-se com vários outros problemas sociais prioritários.
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O Democrata (OD): Ramiro Naka, o senhor é um dos rostos da música e da cultura musical da Guiné-Bissau no exterior. Pode fazer-nos um pequeno resumo da sua carreira musical?
Ramiro Naka (RN): Não sou um dos rostos… eu faço parte daquela família humilde da arte que é uma das grandes riqueza da Guiné-Bissau. Então é com muito grado que sempre estou disponível para representar este país em quaisquer circunstâncias. É por isso que poucas pessoas conseguiram compreender o porque organizei o festival no período do conflito na Guiné-Bissau, bem como o movimento artístico e a manifestações nos períodos difíceis.
Confesso que tenho uma dívida moral com este país. Porque sou Gomes Dias Ramiro Naka, nasci em Sonaco. O meu pai era funcionário naquele sector da Região de Gabú, por isso tive a oportunidade de viajar pelas diferentes zonas da região. No entanto, isso permitiu-me conhecer de perto a cultura deste povo. Eu sinto uma obrigação de trabalhar para a divulgação da minha cultura no mundo fora.
Para falar do percurso de uma artista de 60 anos de idade, que desde aos 15, já andava a cantar, portanto sem contar com as passagens inconscientes. Para mim todo o homem é artista e agora o que conta é aquele que tiver mais sorte e a oportunidade de continuar a desenvolver a sua arte. Por isso mesmo, eu não me considero um artista de nível superior e no meu entender a sorte esteve do meu lado e a oportunidade que soube muito bem aproveitar.
Saí de Sonaco e passei por várias grandes cidades do país e até que vim parar em Bissau. Aqui, naquela altura, era da orquestra musical, Cobiana Jazz, do qual todos os jovens da minha idade queriam fazer parte para cantar. Eu tinha um colega de nome Cipis e o Malafi já falecidos e juntamente com outros tentamos fazer o nosso grupo musical que denominamos de “Panterra Guineus”, onde fazia parte outros músicos. Então foi a partir deste momento que nos convidaram para formar o grupo musical “N’kassa Cobra”.
OD: Qual é a diferença entre Ramiro de salão de luxo, ou seja, da Orquestra “Nkassa Cobra”e de Ramiro de hoje?
RN: Não existe nenhuma diferença o Ramiro do Salão de Luxo e o de hoje, porque sou a mesma pessoa e mesmo artista. O certo é que a vida tem várias etapas que cada pessoa passa. Quando eu fui para “N’Kassa Cobra”, era quem cumpunha as músicas do meu anterior grupo “Panterra Guineus”.
Até eu dava instruções aos meus colegas como deveriam cantar ou tocar a guitarra, mas isso é a coragem de Ramiro e a paixão que tinha na viola, ou melhor, na música em geral. Tocávamos aquelas “notas dublos” da maneira inconsciente. Portanto, de acordo com a sua pergunta, o que faz a diefernça é que houve uma evolução. Antes de entrar no mundo da música de uma forma séria, já tínha descobrido a melodia da minha voz através das cantigas que cantavámos no fanado. O primeiro concurso de cantiga de fanado fora gravado na rádio e aí mostravamos uma verdadeira paxão pela música.
OD: O que é que essa geração tinha de diferente, em relação a música de então e a da geração de hoje?
RN: A diferença que temos é a união. A nossa geração era mais unida e faziamos tudo por amor e sentiamos uma paixão pela música. A nossa geração tinha uma ideologia clara que é preciso a união para fazer funcionar as coisas. Para nós o conjunto é muito importante e davamos tudo para mantermo-nos unidos no conjunto, o que para nós era uma escola. Agora a nova geração é a escola da rua, por isso estão tão perdidos. A geração actual, como toda gente sabe, todos querem fazer sózinhos e sem nenhum enquadramento.
OD: Pode contar-nos a experiência do festival do Estádio Lino Correia que se transformou numa concorrência entre Ramiro Naka de N’Kassa Cobra e Mama Djombo?
RN: Quero lembrar que o grupo “N’Kassa Cobra” não era rival de Mama Djombo e nem de Kapa Negra, porque a orquestra N´Kassa Cobra lançou-se depois das outras. A nossa competição naquele tempo era muito bonita, aliás, lembro-me que era uma competição de bairro contra bairro. Infelizmente o Nkassa Cobra não conseguiu ganhar nenhum festival, mas teve grande presença que foi sentida por todos.
O que era interessante naquela época é que era uma competição com certa harmonia, mas agora é diferente. Estamos numa situação que nem mesmo os artistas se compreendem. E como se sabe antigamente não tocavamos por dinheiro e nem tínhamos televisão – filmar e depois passar ao público. Nós tocávamos pela vontade e o prazer. Tínhamos o gosto de praticar ou fazer aquilo que gostavamos e sabíamos fazer.
OD: Diz-se que a geração de Justino, Manecas e entre outros nasceu por vossa causa, ou seja, é uma geração que se inspirou no vosso talento. É verdade que é assim?
RN: Sim, é verdade e eles têm consciência disso. Eles próprios têm muito respeito por nós e eu também tenho muito respeito por eles. Eu lembro-me que nós e mais colegas de outras orquestras imitavamos o grupo “Cobiana Jazz” até consiguirmos criar o nosso próprio grupo musical. Manecas e Justino, brincamos até agora disso, aliás, recordo que o Manecas na altura, não podia carregar uma viola. Estes acabaram por criar um grupo denominado “Africa Livre” e ali tinha espaço para cada um fazer aquilo que sabia para ajudar o grupo.
OD: Há quem diga que a cultura guineense estava muito bem representada naquela altura. Algumas vozes alegam que a nossa cultura está ameaçada de extinção. Quer fazer um comentário sobre isso?
RN: Sim, a nossa cultura estava muito bem representada naquela altura. A cultura guineese não está ameaçada de extinção, porque os artistas continuam a trabalhar para levar a boa imagem do país no mundo fora. A arte é um dos grandes valores que a Guiné tem, portanto é a única coisa estável que existe neste país. Mas temos que ter a consciência que a instabilidade política nacional, financeira e comercial prejudicam muito e muito a arte.
Não pode imaginar que um país que vive há 40 anos numa instabilidade política, económica e financeira, como serão os trabalhos dos artistas. Por isso é que nenhum artista consegue ter uma estrutura muito bem organizada no nosso país. É por causa dessa situação que a competição interna entre os artista se torna mais renhida e até ao extremo, porque os mais novos poderão pensar que os mais velhos impedem-lhes de ganhar ou obter mais sucessos.
Essa é a razão que me levou a pensar numa reforma na minha carreira, portanto aproveito essa ocasião para aconselhar os artistas da minha idade a deixarem de tocar nos locais públicos, de forma a deixar os espaços para os mais jovens. Imagina que os emigrantes em França que ganham mensalmente dois mil euros, não compram o meu disco. Os dos Estados Unidos de América também têm dificuldade em comprar o meu disco.
Quem comprará o meu disco aqui na Guiné-Bissau e com toda essa dificuldade financeira? E por isso é que eu aconselho os mais jovens para apostarem no trabalho de grupo, ou seja, que voltem a organizar-se em orquestras e ali poderão obter mais sucesso na carreira.
OD: Lembra-se de alguns nomes sonantes dos músicos de diferentes grupos?
RN: Eu lembro-me ainda de vários nomes sonantes de toda essa família de artistas, porque é a nossa vida. E lembro-me ainda dos grandes momentos. Uma vez ia ver o grupo “Cobiana Jazz” e o Rui Neves, que era um dos patrões desse grupo, deitou-nos um balde de água. Recordo também de Gonçalo que foi um dos criadores da orquestra “Mama Djombo” e do Taborda.
Gonçalo era uma pessoa de grande experiência neste sector naquela altura. Ele (Gonçalo) fora convidado pela sua tia de nome Obiara para o grupo “Chave de Ouro” ou Kassa Djass, então foi assim que o Gonçalo me convidou e eu vim com o Pukurusso e o falecido Zeca Garcia. Convidaram-nos um dia para apresentarmo-nos no concerto de grupo “Kapa Negra”. Isso era uma grande oportunidade para nós, porque aquele grupo já se tinha afirmado junto do público. Uma coisa também que eu queria lembrar aqui é que o senhor Adriano Ferreira (Atchutchi) antes de se ingressar no Mama Djombo deu voltas a Bissau para ver os grupos e até foi ter connosco, no “N’Kassa Cobra”, porque tinhamos valores com futuro para afirmarmo-nos no mundo da música.
O Atchutchi tinha ideias ou então canções para fazer impulsionar o N´Kassa Cobra, mas viu que o grupo era muito indisciplinado, razão pela qual acabou por ir parar ao Mama Djombo e a grande verdade é que conseguiu inserir-se e muito bem naquele grupo.
OD: Quantos albuns o Ramiro Naka já editou no mercado?
RN: Quero esclarecer uma coisa que acho muito interessante. Não faço discos para a competição. Fiz o último disco em 2008/2009, intitulado “Gumbé Plus Crioulo”. A partir dali não fiz mais nada, porque não tenho mais novidades para cantar. Só agora, nos dois últimos anos é que consegui uma outra ideia e tive que afinar a viola.
É importante termos em mente que sózinho é muito dificil conseguirmos andar, por isso é que na música se conta com “Manager” que é alguém que orienta o músico nos seus trabalhos. Estou aqui para concentrar-me no meu trabalho, é que, tendo em conta a minha idade, estarei um pouco limitado agora.
Vocês sabem que fui professor na escola central, portanto não vou cansar-me de falar com os mais novos nesta área, porque é a única coisa que eu posso oferecer. Tenho uma dívida moral com esta terra e com a minha cultura. Aliás, uma das razões que me levou a comprar este espaço é para fazer um filme com o cineasta Flora Gomes para contar a história da minha terra e ganhar muito dinheiro.
OD: Qual é exactamente o número de discos produzidos por Ramiro Naka?
RN: Relativamente aos números de discos editados, tenho muitos discos e vou lembrar-lhe de alguns, como “Matchu Lelé”, depois “Fanta Mané”, tenho ainda “Nbá Luta”. São muitos os discos que editei no mercado. Também lembro-me do disco “Tchon Tchoman” que é um disco produzido pelo produtor do grande músico Bob Marley. Por isso mesmo é que essa música de Tchon Tchoman e de “Chofer Latch” ganharam muita proporção no mercado. Na altura eu estava no momento e razão pela qual trabalharam comigo e puseram o trabalho no mercado mundial, por isso ganhou muita fama.
Considero a música “Tchon Tchoman” como um património de todos os guineenses. É uma música que projectou a imagem da Guiné para o mundo fora. Não porque é a música do Ramiro, mas muita gente pode testemunhar o que estou a dizer, tanto os que estavam na Guiné bem como os que se encontravam no exterior, quando a música foi editada no mercado.
Lembro-me que gravei algumas músicas com “Saba Minhanba”, como também gravei outras músicas com alguns artistas.
OD: Saba Minhamba era visto como o opositor do regime do Presidente Luís Cabral naquela altura. Pode falar-nos um pouco de Saba Minhamba?
RN: Naqueles tempos, bastava pensar diferente para ser considerado logo de opositor. E como defendemos na altura que a Democracia era a troca de ideias, fomos considerados de opositores ao regime.
A verdade é que na altura estávamos a desmascarar aquilo que se passava na Guiné-Bissau através das grandes composições musicais de Jorge Medina, tais como: Kin kon bida, rabu di Padja, entre outros.
Isso não era nada fácil naquela altura, mas acreditávamos que estávamos a fazer o nosso trabalho em prol do povo guineense. Como sabem, vocês actualmente têm um papel muito importante a desempenhar nesta sociedade no sentido de formar e informar a sociedade.
OD: No conjunto das músicas editadas por Ramiro Naka, qual é a música que mais marcou a sua carreira, ou seja, que o projectou para o mercado internacional?
RN: Confesso que é difícil dizer… porque, como sabe, um pai gosta de todos os seus filhos. Em cada passagem da minha vida tive períodos diferentes que me marcara. No entanto, as coisas mais marcantes aconteceram quando era mais novo e tudo aquilo que fizemos naquela época marcou-me muito.
É por isso que fizemos uma música “Nené Tuti/Naka – Lembra tempu di Nkassa Cobra”. E produzimos quatro volumes, mas apenas saiu um. O período que mais me marcou foi o início da minha carreira musical. Não é agora que tenho meios para comprar uma guitarra ou instrumentos musicais. Naquele período em que estávamos a iniciar a carreira, era muito difícil. Era um momento em que lutávamos para erguermo-nos e conseguir uma afirmação no mundo da música.
Tive que trabalhar ali na estação de venda de combustíveis para poder comprar uma viola e foi o meu pai que me tirou dali. Em França eu tive que tocar no metro para pedir caridade para comer e comprar os instrumentos musicais.
OD: “Tchon Tchoman”é a música mais conhecida de Ramiro Naka. Confirma que é a música que levou o Ramiro ao mercado internacional?
RN: A música “Tchon Tchoman” de facto é a mais conhecida, mas todas as minhas músicas são importantes para mim. Mas é muito importante a promoção das músicas dos cantores nacionais nos órgãos da comunicação social, por isso acho que esse é o vosso trabalho: ajudar na duvulgação da cultura guineense. Aliás, as pessoas da minha geração preferem as músicas antigas e, sobretudo àquelas do tempo de N´Kassa Cobra.
OD: Como vê a música hoje na Guiné-Bissau? Há quem diga que as músicas hoje fazem muito barulho e não se toca nada.
RN: A música da Guiné está bem. A verdade é que não se toca nada, porque não têm orquestras para tocar e fazer vibrar o público. O grande problema é a nova geração que eu considero a geração do barulho, porque tentam fazer aquilo que ouvem, vindo de fora.
Outro problema é que alguns músicos tentam imitar outros artistas de fora, sem no entanto, preocupar-se em mostrar ou explorar aquilo que têm dentro para transmitir ao mundo. A música que me deu de comer, ou seja, que salvou o Ramiro Naka é aquela música que intitulei de “Ndulé – Ndulé”.
Eu fiz essa canção com a minha filha e até participamos num festival em Itália para apresentar essa música. Para os ocidentais, o ‘Gumbé’ é orginal, por isso gostam do nosso estilo. Mas outras músicas como aquelas tocadas pelo “Kassav”, eles já se habituaram a ouvi-las, por isso preferem o estilo mais africano.
OD: Como veterano e músico reconhecido internacionalmente que conselho dá aos mais novos?
RN: Aconselho-os para apostarem na música tradicional, porque também com a música tradicional, ou melhor, a música da Guiné-Bissau se pode conquistar o mercado europeu. As outras músicas que os jovens de hoje tocam, e a verdade é que se tocam muito nas discotecas, corre-se o risco de ver o disco ser comprado pelos frequentadores das discotecas e apenas para dançarem.
Naqueles tempos sentia-me muito triste, porque as minhas músicas não tocavam nas discotecas e nem os guineenses ouviam-nas. Mais tarde percebi que tinha uma sorte e que os ‘brancos’ gostavam muito das músicas tradicionais que eu tocava, sobretudo a mistura de ‘Gumbé Plus Crioulo’. Consegui afirmar-me internacionalmente e ganhar a minha vida junto dos brancos e sem fazer barrulho, apenas apostando nos ritmos tradicionais africanos. Acho que os jovens da nova geração ainda podem aproveitar muito a nossa cultura e em particular os ritmos africanos para compor músicas e apresentá-las ao mundo.
OD: O país conta já com 42 anos da independência e até agora os homens da cultura continuam a enfrentar enormes dificuldades nos seus trabalhos. Não acha que é urgente definir uma política da cultura na Guiné-Bissau?
RN: É necessário definir uma política de artistas, ou melhor, da cultura sem a intervenção de Estado. Devemos voltar a trabalhar em conjunto através das orquestras como nos tempos passados e para isso não é preciso a intervenção do Estado. Naquela época faziamos tudo sozinhos, mas conseguimos projectar a boa imagem da cultura dos guineenses e do próprio país ao mundo.
É por isso que criamos um espaço cultural denominado de “Naka Espaço Cultural”. E através da ‘Fundação Naka’ podemos disponibilizar o espaço para apoiar os cantores que queiram utilizá-lo para os concertos.
Cada artista que se interessar em fazer parte da organização, terá que cumprir com as obrigações que é de pagar as quotas fixadas para o fundo da organização. Podemos dispensar os equipamentos para o ensaio aos inscritos e que cumpram com as suas obrigações e até mesmo podemos dispensar material para gravar.
Para nós não é o Estado quem vai arrumar todo o problema dos artistas, ou então, resolver toda as dificuldades que os homens da cultura enfrentam. O Estado está na fase da aprendizagem da democracia e, aliás, como se sabe, o nosso Estado é como uma criança que está a tentar erguer-se para aprender a dar os primeiros passos. O Estado depara-se com problemas de fome para se auto-sustentar, portanto será que podemos esperar deste alguma coisa?! Nós é que temos que nos levantar para lutar e defender a nossa cultura, bem como trabalhar com suor para projectar a cultura guineense para o mundo fora.
OD: Havia muitas bandas músicas depois da independência, mas agora apenas há uma única banda musical que é o Tabanka Djazz. Como é que explica isso?
RN: Porque naquela altura havia mínimas condições para trabalhar em grupo e fazer um bom trabalho. Agora a situação é difícil e as pessoas estão sem salários para garantir a sobrevivência.
Quanto a nós, vamos tentar voltar às bandas através da iniciativa “Naka – Nkassa Cobra”. Para fazer uma banda é preciso ter um espaço apropriado para ensaios e acima de tudo são precisas certas condições.
Uma orquestra é como uma empresa e cada artista é chefe da empresa. É preciso termos a capacidade técnica de trabalho e financeira para não contrairmos dívidas com os empregados. Sem essas condições técnicas e financeiras é dificil fazer uma banda funcionar, porque a raça crioula é muito inteligente e ninguém deixa para outro. Se se começar com uma iniciativa de banda por exemplo, começa-se logo a pensar em quem vai guardar o dinheiro do grupo.
OD: Essa situação não aconteceu com a N´Kassa Cobra, Mama Djombo e outros. Será que essa geração não seria capaz de organizar-se em grupo?
RN: Essa geração não é capaz de fazer isso, porque são inteligentes todos e mais, toda gente quer ganhar dinheiro rapidamente. É trabalhar com eles e mostrar a vantagem de trabalhar em grupo. É preciso trabalhar com a nova geração bem como aconselhá-los a prosseguir com a formação para terem uma profissão, quando deixarem de cantar.
Quando eu era jovem e um amigo norte-americano me perguntou o que é que fazia, além de cantar,pediu-me para ser dançarino, porque entende que tenho físico para ser dançarino. Eu não queria dançar, mas foi a partir dali que tomei a iniciativa de ir para Sporting Clube de Portugal.
Ingressei no Sporting como atleta e corria 100 metros em doze segundos. Ficaram impressionados comigo porque naquela altura o record de mundo (1976) de 100 metros era de onze segundos. Corri pelo Sporting e consegui o record de doze segundos e até peguntaram-me do meu Clube na Guiné. Eu tinha que correr pelo Sporting a fim de ajudar na minha sobrivivência e com isso ganhava alguma coisa, inlcuindo a senha para a cantina e transportes e a noite eu ia tocar.
OD: Toda gente que cantava aqui no país pela independência de repente saiu daqui para Portugal. Voltaram com outra imagem. O que vos levou a jun-tarem-se em “Saba Miniamba” em Lisboa?
RN: A nostalgia e a saudade… porque éramos de grupos diferentes como se sabe. Eu pertencia ao agrupamento N’Kassa Kobra, Sidónio País era de Kapa Negra, Medina de Mama Djombo. Então, havia uma necessidade, na época, porque a Guiné-Bissau não tinha nenhuma representação em termos da música em Lisboa, só tinha senhor Bana. E todos os filhos de Guiné identificavam-se como cabo-verdianos.
Temos filhos de origem cabo-verdiana que nasceram aqui com todo respeito e com muita honra e somos irmãos, mas os guineenses precisavam de manter a sua própria identidade. Foi nessa circunstância que “Saba Miniamba” foi-me buscar para organizarmo-nos num grupo, para criticar as más políticas dos governantes, assim como defender a imagem do país em Portugal.
OD: Quando se deu o golpe do Estado em 14 de Novembro de 1980 já estava em Paris, pensava na altura que a vitória tinha sido conseguida?
RN: Era uma esperança…a Guiné merecia ter uma outra cara. Na altura pensamos que já estávamos em boas mãos. É por isso que no fim da história ficamos com muita tristeza, tudo por culpa dessa humilhação política à uma nação. Também como estou na família de arte não conheci muito dos nossos políticos.
OD: Como é que vê a participação dos grandes artistas nas campanhas eleitorais, apoiando os políticos?
RN: Creio que não posso julgá-los, porque têm fome. Se alguém me solicitasse para fazer campanha eleitoral faria algumas exigências. Diria ao político que, como já tem casas e quer ser Presidente da República, então pediria a chave de uma casa e só depois disso é que faria a campanha eleitoral pelo político.
OD: Qual é o critério para ser músico na Guiné-Bissau?
RN: Basta ter umas calças bonitas e poemas. Houve um rapaz que me diz que quer cantar, porque tem duas poesias. Mas não tive tempo para lhe explicar que no Kobiana Djaz, havia muitas pessoas que não estavam no anonimato, mas que escreviam para os outros elementos do grupo como Zé Calos e Aliu Bari cantarem. Na verdade, tive muita sorte. Para ser artista, precisas ter pessoas que trabalham com seriedade em diferentes áreas que compõem a vida musical. Uma pessoa que consegue gerir a sua família, pode ser-lhe confiada um grupo. Mas aqui há gentes que nem sabem gerir a sua família e dirigem grupos até mesmo o governo.
OD: Ramiro qual é o futuro da música guineense no mundo?
RN: O futuro da música guineense está nas mãos dos jovens.
OD: Já pensou em fazer algo para transformar o país ou pelo menos cidade de Cacheu numa rota da cultura?
RN: É muito difícil, porque eu já tomei uma iniciativa para construir uma casa da cultura aqui em Bissau e outra no Ilhéu do Rei. Acho que cada um músico deve formar um pequeno conjunto ou associações musicais nos seus bairros, mas com uma estrutura. O Estado tem fome, dentro do estado há pessoas que não conseguem gerir as suas casas e por conseguinte não podem gerir a cultura, isto é uma realidade. Cada vez que mudamos de governo, entra uma equipa que tem fome, por isso, as vezes penso que a solução seria manter a equipa que já roubou.
OD: Não acha que era bom Ramiro Naka, Zé Manel, Atchutchi e outros veteranos juntarem-se em prol do desenvolvimento da nossa cultura?
RN: Não iria funcionar, porque não se pode misturar o Benfica e o Sporting, de um dia para outro, claro não funcionaria. O que pode funcionar é o Benfica organizar-se bem e o Sporting preocupar-se-ia em se organizar melhor que o Benfica!
OD: Acha que a música nacional pode chegar a topo mundial onde está a Kizomba hoje?
RN: Não… porque mesmo o nosso país faz a promoção da música Kizomba. E Angola paga para divulgar a Kizomba e nós aqui que nem conseguimos pagar aos nossos empregados. Tenho um cinvite do Brasil para levar quatro, cinco até seis artistas. A cultura deveria dar-me somente os bilhetes, mas não pode.
OD: O que é que Naka faz além da música actualmente?
RN: Quando estou cansado de fazer música ou de ensaiar, pinto. Se não for a pintura faço cinema ou teatro. Ainda gosto muito de escrever. Estamos a produzir muitos livros, também a minha actividade matinal é o desporto, ou seja, a primeira coisa que faço ao levantar-me, mas o estúdio consome uma boa parte do meu tempo.
Por: Assana Sambú/Sene Camará
Fotos: Marcelo N’Canha Na Ritche
#odemocratagb.com

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Samuel

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