O nacionalista angolano e membro fundador do Movimento Popular de
Libertação de Angola (MPLA) Lúcio Lara morreu ontem, em Luanda, vítima de
doença prolongada.
Lúcio Lara, filho de pai português e mãe angolana, tinha 86 anos. Natural
da província do Huambo, o nacionalista angolano fez os seus estudos em
Portugal.
A sua militância no partido maioritário iniciou-se na década de 1950, em
Angola e entre angolanos no exílio, tendo sido eleito secretário da organização
e dos quadros do partido na primeira conferência nacional do MPLA, em Dezembro
de 1962. Posteriormente, passou a secretário-geral.
O Bureau Político do Comité Central MPLA considera Lúcio Lara, que
morreu este sábado em Luanda, por doença, “um artífice da luta pela
independência de Angola”.
Em comunicado, o Bureau Político do MPLA refere a “profunda comoção”
causada pela morte deste nacionalista e realça a “inestimável participação” de
Lúcio Lara em prol da autodeterminação dos angolanos.
“Nascido aos 9 de Abril de 1929, o camarada Lúcio Lara foi um artífice
da luta pela Independência de Angola, ao lado do primeiro Presidente de Angola,
Dr. António Agostinho Neto, e outros eminentes nacionalistas, tendo inscrito o
seu nome com letras de ouro na nossa história recente, pela sua inestimável
participação na árdua caminhada em prol da Liberdade, da Autodeterminação e da
Independência Nacional”- lê-se no comunicado.
Pelo infausto acontecimento, o Bureau Político do Comité Central do MPLA
“inclina-se perante a memória deste ilustre combatente da pátria angolana” e
endereça as condolências à família enlutada em nome dos seus militantes,
simpatizantes e amigos.
Para se saber com exactidão quem foi, na óptica do regime, Lúcio Lara,
nada melhor do que transcrever o texto do Jornal de Angola:
“Também conhecido por Tchiweka, pseudónimo de guerra escolhido em
homenagem à terra da sua mãe, uma aldeia situada no Huambo, a morte de Lúcio
Lara é a partida de uma das principais figuras da luta pela independência do
país do jugo colonial.
Lúcio Lara foi o exemplo de jovens que, na década de 40 do século XX,
abraçaram os ideais de liberdade e de progresso e, determinados, formaram um
amplo movimento de libertação nacional com o objectivo de quebrar as algemas da
repressão e devolver ao povo angolano o sonho de independência que a
implantação do colonialismo havia roubado.
A repressão colonial fascista fez emergir uma geração de angolanos que
procurou, dentro e fora do país, criar as condições para que o processo de luta
anti-colonial ganhasse uma outra dinâmica e reconhecimento a nível africano e
internacional.
É neste contexto que Lúcio Lara se destaca como um dos impulsionadores
de todo o processo de organização política que veio a desenvolver-se, tendo
como ponto de partida a Casa dos Estudantes do Império, em Coimbra, onde se
encontrava a estudar e onde deu início à actividade política, em 1949. Com
Agostinho Neto, Humberto Machado, Zito Van-Dúnem, e outros nacionalistas, Lara
fazia também parte do Clube Marítimo Africano, em Lisboa, importante ponto de
encontro para troca de informações, de documentos e de coordenação da luta
clandestina contra o poder colonial.
Quando a PIDE (polícia secreta portuguesa) desencadeia uma vaga de perseguições
e detenções, entre 1950 e 1959, Lúcio Lara refugia-se na Alemanha. É seguindo,
depois, a rota Tunes (Tunísia), Rabat (Marrocos) e Conacry (Guiné Conacry) que
faz o regresso ao continente. A partir desta última capital, enceta um intenso
trabalho político que, em conjunto com Agostinho Neto e demais nacionalistas, o
vai guindar à posição de co-fundador do Movimento Popular de Libertação de
Angola.
A participação na luta de libertação nacional, a entrega total à causa
do povo angolano, o empenho para tornar Angola um país uno e indivisível,
fizeram de Lúcio Lara uma figura incontornável no seio do MPLA.
A luta gloriosa levada a cabo ao longo de 14 anos de guerrilha em
Angola, que se espalhou praticamente por todo o país, a par das guerras de
libertação que teve de enfrentar nas outras ex-colónias, levaram o poder
colonial a claudicar. O golpe de Estado que em 25 de Abril de 1974 pôs fim à
ditadura colonial fascista em Portugal foi o corolário de todo esse longo
processo de desarticulação da máquina que Salazar havia montado.
Como resultado, a 8 de Novembro de 1974 Lúcio Lara aterrava em Luanda à
frente da primeira delegação do MPLA que se deslocou à capital angolana depois
do derrube da ditadura em Portugal. Viria então preparar o regresso de Agostinho
Neto, que teria lugar em Fevereiro de 1975.
Foi Lúcio Lara quem empossou Agostinho Neto como primeiro Presidente de
Angola, e foi também Lúcio Lara quem deu posse ao Presidente José Eduardo dos
Santos, depois do desaparecimento físico do fundador da nação.
Falar de Lúcio Lara é tão somente falar de um dos grandes vultos da
política angolana que, ao lado de Agostinho Neto, marcou de forma inapagável um
dos mais ricos períodos da história da luta pela autodeterminação do povo
angolano e pela afirmação de Angola como país soberano no concerto das nações.
Com a sua morte, parte o último fundador até então vivo do Movimento
Popular de Libertação de Angola.
Não é este texto, como é óbvio, suficiente para traduzir a dimensão
política de um homem da envergadura de Lúcio Lara.
Os grandes homens podem partir, mas as suas obras ficam para a
eternidade como testemunho da sua grandeza, da sua estatura política, cultural,
moral e cívica invulgares. Angola agradece por tudo quanto Lúcio Lara foi capaz
de fazer para engrandecer o país e tornar os angolanos cidadãos dignos no
mundo, sem vergonha da sua própria identidade.”
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Samuel