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sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

"Governo Temer foi grande contribuição ao processo civilizatório".

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Em entrevista à DW, Gilmar Mendes elogia atuação de Michel Temer e avalia que o país não corre o risco de retrocesso democrático após as eleições. "As instituições estão em funcionamento", diz ministro do STF.
fonte: DW África
O ministro do STF Gilmar Mendes
Gilmar Mendes chegou ao STF em 2002, por indicação do então presidente Fernando Henrique Cardoso
Após anos de turbulência, o Supremo Tribunal Federal (STF) se prepara para lidar com a chegada de um novo ocupante na Presidência da República. Para o ministro Gilmar Mendes, a ascensão de Jair Bolsonaro e o fortalecimento da direita no Brasil serão uma "fase de aprendizado" e, apesar do tumultuado processo eleitoral deste ano, não há ameaça para a democracia brasileira. "As instituições estão em funcionamento", disse ele em entrevista concedida à DW Brasil por telefone.
Ainda segundo o ministro, 2019 deve marcar o início da diminuição da judicialização da política, após o STF ter atuado por anos como árbitro de disputas envolvendo o Executivo e o Congresso, poderes que foram atingidos em cheio pela Operação Lava Jato. A poucos dias do fim do governo Michel Temer, ele também elogiou o presidente de saída. "Foi um governo de feição liberal, civilizada; não se viu arroubos, agressões verbais, ataques. Então me parece que foi uma grande contribuição para o processo civilizatório", disse.    
Gilmar Mendes chegou ao STF em 2002, por indicação do então presidente Fernando Henrique Cardoso. É uma figura controversa no tribunal. Após passar anos sendo criticado pela esquerda, que o acusava de ser antipetista, o ministro passou a ser alvo nos últimos anos da direita, que o enxerga como um adversário da Lava Jato e como leniente em relação à concessão de habeas corpus. "Continuei no mesmo lugar, as pessoas que mudaram de entendimento."
DW Brasil: Como o senhor avalia o estado da democracia brasileira após as eleições?
Gilmar Mendes: Nós celebramos os 30 anos da Constituição num quadro de alguma instabilidade política, mas de normalidade institucional. Diferentes correntes ocuparam a Presidência da República nesses anos. Agora temos essa proposta de um governo de perfil mais conservador.
Mas não me parece que se esteja colocando em risco as instituições. Será um aprendizado. Há um Congresso novo, um partido novo – que se tornou a segunda maior bancada. E as instituições estão em funcionamento. Então não me parece que haja uma ameaça para a democracia.
Há muita discussão sobre a utilização das fake news e do Whatsapp, e tivemos o grave incidente do ataque ao próprio candidato Bolsonaro. Mas as eleições transcorreram normalmente, apesar de toda aquela imputação feita pelo próprio candidato vencedor de que poderia haver fraude nas urnas.
No final, vimos que foi uma eleição absolutamente limpa e transparente. O próprio Bolsonaro teve que pedir desculpas à Justiça Eleitoral pelas chamadas "caneladas". Então me parece que as instituições estão em funcionamento. É um modo talvez agora diferente de tentar organizar a política, de formar maioria. Vamos torcer para que haja bons resultados.
Como o senhor espera que seja a relação em 2019 entre Judiciário, Executivo e Legislativo após anos de judicialização da política?
O que ocorreu no Brasil, especialmente em função das operações policiais, com destaque para a Lava Jato, foi um atingimento muito forte tanto do Legislativo quanto do Executivo. Nós tivemos o impeachment da presidente Dilma e depois as acusações contra o presidente Temer. E também um atingimento de todas as forças políticas. De modo que o Judiciário se tornou um protagonista quase central da cena política. E muitas vezes era chamado a arbitrar questões que talvez não devessem ser arbitradas.
Agora nós temos outra situação. É um novo parlamento, um novo governo. Vai depender da agenda de conflitos, das próprias políticas públicas que o governo venha a encetar na área de direitos humanos, na área indígena. Imagino que, dependendo das políticas, os atingidos certamente vão se dirigir ao Judiciário.
Isso não exclui uma eventual judicialização. Mas talvez não haja mais aquela banalização que nós tivemos no passado em que o Judiciário acabava atuando quase que cotidianamente em função do debilitamento e enfraquecimento que houve dos demais poderes.
O episódio envolvendo as declarações de um dos filhos do presidente eleito de que seria fácil fechar o Supremo e que citaram o senhor especificamente foi superado?
Tenho a impressão de que isso foi em uma reunião de estudantes. Já apontei a impropriedade das declarações, que isso não fazia o menor sentido.
Em outro caso, um coronel que anunciou que agrediria a corte acabou preso [o ministro se refere ao caso em que um coronel da reserva divulgou ameaças ao STF em outubro]. Então não me parece que existe clima para isso. E para alguém fazer algo assim seria preciso comandar as Forças Armadas. Não é só um soldado e um cabo. E as Forças Armadas brasileiras não são golpistas, não estão a serviço de golpistas. Elas são órgãos constitucionais e institucionais.  
A Lava Jato vai completar cinco anos em 2019. O senhor é conhecido por ser um crítico de vários aspectos da operação. Sua visão continua a mesma?
Considero imensa a obra da Lava Jato. Nós já tínhamos tido outras e boas operações de combate à corrupção, mas essa foi obviamente a mais completa. O mensalão inicialmente pegou o coração do governo Lula, do governo do PT, mas isso tinha metastaseado para todos os lados.
Mas as minhas divergências são em relação a eventuais métodos, eventuais abusos na valoração das delações, os exageros muitas vezes das prisões provisórias. Continuo entendendo esses pontos como negativos, que precisam ser discutidos.
Em uma operação paralela à Lava Jato, a Polícia Federal prendeu o reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e logo depois ele cometeu suicídio. E se verificou depois que ele não tinha nada a ver com o assunto. Não havia nenhuma imputação a ele. Portanto, exageros policiais provocam tragédias. Há outros casos, como a Operação Carne Fraca, em que se fez um grande escândalo em torno da carne brasileira que não correspondia à realidade. Em suma, é preciso ter autocontenção nessa matéria.
A análise das ações sobre o cumprimento das prisões após a confirmação em segunda instância deve ocorrer em abril.  Caso o tribunal mude de posição, o STF não vai se desgastar diante da opinião pública, que nas últimas eleições elegeu um candidato que explorou o discurso anticorrupção e defendeu mais punições?
Esse é o destino das cortes constitucionais. Elas podem passar por esses momentos de impopularidade. A concessão de um habeas corpus em um ambiente muito punitivista em geral é muito impopular. Mas é preciso que se mantenham os padrões civilizatórios. Já tivemos políticos que no passado se elegiam defendendo a pena de morte ou o recrudescimento das penas.
Só que nós temos um grave problema de segurança pública já na descoberta dos delitos. Uma grande parte dos homicídios no Brasil é de autoria desconhecida. Portanto, nós temos uma grande falha no sistema repressivo como um todo. Quer dizer, os delitos que são notificados não são descobertos. Não é o anúncio do recrudescimento, do aumento de pena que vai melhorar o sistema carcerário. Muitas vezes demoramos muito para colocar as pessoas em um tribunal do júri. Então temos falhas no sistema como um todo. Tudo isso precisa ser revisto.
Por anos o senhor foi bastante criticado pela esquerda brasileira, que o acusava de perseguição ao PT. Nos últimos dois anos, o senhor também parece ter virado um alvo da direita por causa das suas críticas à Lava Jato e pela concessão de habeas corpus para alvos da operação. Como o senhor se sente em relação a isso?
As pessoas sabem que não sou nem de extrema esquerda nem de extrema direita. Acho que continuei no mesmo lugar, as pessoas que mudaram um pouco de entendimento. Obviamente, durante todos esses anos de governo do PT, eu era visto como antipetista por causa das minhas críticas.
Se você olhar, o tempo político é que muda. Eu cheguei indicado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. Em seguida veio o presidente Lula, e passamos a ter novas políticas e novos questionamentos. O quadro mudou substancialmente nesses anos. Eu nunca fui defensor desse punitivismo penal exacerbado. Ao contrário, sempre fui crítico e por isso minhas posições são às vezes aplaudidas, outras vezes, criticadas.
Como o senhor avalia o governo Michel Temer?
Eu tenho a avaliação de que, considerando as dificuldades, ele realizou tarefas importantes. Manteve a estabilidade, corrigiu aquela rota de decadência econômica.
Não conseguiu fazer a reforma da Previdência, mas conseguiu a trabalhista. Ele também deixa um legado importante em algo que há muito tempo se reclamava no Brasil, que era a presença mais forte da União na esfera da segurança pública. A União legisla sobre direito penal, sobre execução penal, tem a Polícia Federal, tem as Forças Armadas, mas ela dizia que a questão da segurança pública era dos estados.
Foi também um governo de feição liberal, civilizada; não se viu arroubos, agressões verbais, ataques. Então me parece que foi uma grande contribuição para o processo civilizatório. Tudo isso considerando as limitações, afinal era um governo provisório. Temer tinha as limitações de ter sido vice da Dilma, mas acho que acabou fazendo um bom governo.
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Samuel

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