A Procuradoria-Geral da República (do MPLA) abriu – tanto quanto diz a máquina de fabrico de boas intenções – uma investigação sobre o caso em que o Estado foi lesado em 4.700 milhões de dólares (4.100 milhões de euros) com investimentos privados feitos com fundos públicos.
Citado (obviamente) pelo Jornal de Angola, o general Hélder Pitta Grós indicou que a PGR está a recolher toda a documentação necessária (o que poderá levar muito tempo) para depois chamar os cidadãos envolvidos no desvio do dinheiro do Estado. Seria bom chamar também os que permitiram esse desvio, seja por acção ou omissão.
“Quando se chegou à conclusão de que havia utilização irregular dos recursos, identificaram-se logo algumas pessoas, mas é necessário que tenhamos toda a documentação e ouvi-los sobre a situação”, disse Hélder Pitta Grós, que acredita que alguns processos que estão a ser investigados “terão uma solução rápida”.
“Os processos não são iguais. Alguns casos podem ter uma solução mais rápida e pode acontecer que alguns casos possam não seguir a via judicial. Os processos em posse da PGR continuam a correr a sua tramitação normal”, afirmou o PGR.
Hélder Pitta Grós indicou que, em 40 anos, a PGR (do MPLA) procurou afirmar-se, realizando as suas competências constitucionais, embora nem tudo tem sido fácil.
“Tem havido muitos obstáculos, dentro e fora da PGR, mas temos conseguido vencê-los com muito empenho”, disse, reconhecendo que nem sempre as acções da PGR agradam a todos.
“Mas vamos procurar ter sempre em conta que a nossa actividade é servir e temos procurado servir da melhor forma possível”, disse, prometendo unir todos os procuradores para que se identifiquem com os ideais que a instituição defende.
“Temos de despir-nos de alguns preconceitos e procurarmos ser uma equipa em que todos temos de dar um contributo determinante”, sublinhou, garantindo que vai trabalhar para que a instituição tenha uma equipa “coesa e dialogante”.
A denúncia foi feita a 13 de Março passado num comunicado do Conselho de Ministros, em que o Governo indicou ter sido lesado naquele montante, valor definido nos trabalhos de uma Comissão Multissectorial criada em Dezembro de 2018 pelo Presidente de Angola, João Lourenço.
No dia seguinte, no acto de abertura do ano judicial de 2019, no Lobito, João Lourenço considerou ser, “no mínimo, chocante e repugnante” o relatório sobre os investimentos privados realizados com recurso a “avultados fundos públicos”.
O Presidente referiu que, após os seis meses de graça que a lei conferiu aos visados para devolverem o dinheiro ao país, prazo que terminou em 26 de Dezembro de 2018, o Estado “está no direito de utilizar todos os meios ao seu alcance para reaver o que ao povo angolano pertence”, no quadro do Repatriamento Coercivo de Capitais.
A Lei de Repatriamento de Capitais foi aprovada em 26 de Junho de 2018 com o objectivo de devolver a Angola os montantes investidos no exterior do país, ilegalmente colocados em paraísos fiscais e outras praças financeiras, prazo que terminou em 26 de Dezembro do mesmo ano e cujo total já eventualmente retornado ainda está por relevar.
“Passados que são três meses [desde o final do prazo, tendo entrado em vigor a Lei de Repatriamento Coercivo de Capitais], estamos empenhados a trabalhar nesta direcção, com o concurso dos cidadãos que denunciam, dos competentes serviços de investigação, do Ministério Público e dos tribunais, que intervirão quando chegar o momento certo”, afirmou João Lourenço.
Em 18 de Março, o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Francisco Queiroz, garantiu que o executivo iria revelar, “nos próximos dias”, a lista de investidores e de investimentos privados feitos com fundos públicos que lesaram o Estado, tendo, nove dias depois, idêntica garantia sido dada pelo secretário de Estado da Justiça, Orlando Fernandes, mas até hoje nada foi adiantado.
As palavras vão voando, voando…
Ogeneral Hélder Pitta Grós, Procurador-Geral da República do MPLA, o único partido que governa Angola há 43 anos, afirmou no dia 16 de Novembro de 2018 que a falta de verbas estava a condicionar a cooperação internacional e o cumprimento de diligências como cartas rogatórias. Que chatice. É preciso arranjar quem nos dê mais uns milhões de fiado para resolver este problema. Talvez a Rússia, não?
Hélder Pitta Grós falava na Assembleia Nacional do MPLA num encontro entre as primeira e décima Comissões de Trabalho Especializadas e representantes do Tribunal Supremo, Tribunal de Contas, Tribunal Constitucional, Tribunal Supremo Militar e o Ministério da Justiça e Direitos Humanos, no âmbito da (suposta) apreciação do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2019.
Segundo o Procurador-Geral da República, “os novos ventos, que este ano surgiram”, levou a PGR a realizar actividades inéditas que tiveram de ser feitas “com ou sem recursos”. É obra, reconheça-se. Fazer “actividades inéditas” e ainda por cima “sem recursos” não é para qualquer um. Bravo, general Hélder Pitta Grós.
“Não deixamos de fazer o nosso trabalho porque não tínhamos recursos”, disse Hélder Pitta Grós, para enumerar as dificuldades por que passam para a execução das actividades.
“Temos outros técnicos que trabalham connosco, trabalham um, dois meses, a ordem de saque não é paga e ele vai embora, porque diz que não está para trabalhar de borla”, disse o PGR. Então como é senhor Presidente da República? Então como é senhor Titular do Poder Executivo? Então como é senhor Presidente do MPLA? Assim não vale! Trabalho escravo, só mesmo para os angolanos de segunda.
A situação repete-se com “os próprios investigadores, os magistrados”, apontou Hélder Pitta Grós. Num Estado de Direito, que é algo que Angola (ainda) não é, o PGR seria demitido (já que, reconhecidamente, não tem coragem para se demitir) ou o Presidente da República (João Lourenço) viria a público – numa comunicação ao país – pedir desculpa e reconhecer que, afinal, um ano depois só mudaram (algumas) moscas.
“Eles trabalham o dia inteiro, de manhã até à noite, e têm de tirar do seu bolso, precisam de comer, de fazer telefonemas, têm de pagar o seu saldo, têm de tirar fotocópias e utilizam o seu dinheiro para isso. Portanto, temos de saber bem aquilo que a gente quer. Temos não só de combater os crimes, como também de fazer a prevenção, e a prevenção também custa dinheiro”, disse Hélder Pitta Grós.
A PGR conta também com a cooperação internacional, que tem sido fundamental, segundo o magistrado, tendo exemplificado que, em 2017, registaram um total de 124 cartas rogatórias nos dois sentidos – recebidas e enviadas.
“Até Setembro deste ano, já estamos em 300, e isso também é dinheiro, porque as cartas rogatórias têm de ter tradução, de ter fotocópias. Muitas vezes temos de buscar especialistas para nos ajudarem, porque não podemos ver a cooperação judiciária só num sentido, dos outros para connosco. Nós também temos de dar alguma coisa e sentimos isso, às vezes, quando temos contactos com algumas entidades no exterior, em que nós procuramos informação”, referiu.
“Eles perguntam: ‘e vocês o que têm?’ A cooperação judicial não é só ir buscar, tem de se receber e ir buscar e quanto mais se dá, mais se recebe. Se não se dá nada, não se recebe nada e isso é dinheiro”, frisou.
Hélder Pitta Grós disse estar ciente das dificuldades por que o país passa, mas espera alguma abertura do Ministério das Finanças. Bem pode esperar sentado, o que certamente fará num cadeirão cómodo e bem estofado. Nem o ministro Archer Mangueira nem o Presidente João Lourenço estão interessados em resolver este e milhares de outros problemas que o MPLA criou ao longo dos últimos 43 anos.
“Temos consciência de que o dinheiro é pouco, mas, se trabalharmos em conjunto com o Ministério das Finanças, podemos ver a melhor forma de gastarmos o pouco que existe. Agora, quando apresentamos uma proposta e depois recebemos a contraproposta, sem termos sido ouvidos, da forma como é feita, dificulta um bocado todo o exercício que se queira fazer”, lamentou.
O Orçamento Geral do Estado para 2019, foi já aprovado, na generalidade, pela Assembleia Nacional, que se prepara agora para a sua discussão na especialidade.
Folha 8 com Lusa
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Samuel