NO BALUR I STA NA NO KUNCIMENTI, PA KILA, NO BALURIZA KUNCIMENTI!...
Augusto Cuteta
A citação que dá título a esta entrevista é do jovem angolano João
Paulo de Morais, especialista em Logística Militar e Gestão de Recursos
de Defesa, especialidades que estão na origem de um convite que lhe foi
formulado pela consultora britânica SMI, especializada em questões de
Defesa e Segurança Internacional, para ser um dos oradores da “20ª
Conferência Anual sobre Transporte Aéreo Militar e Reabastecimento
Ar-Ar”, que vai decorrer de 3 a 4 de Dezembro, em Lisboa, Portugal. O
entrevistado, de 33 anos, já trabalhou para a Organização do Tratado do
Atlântico Norte (OTAN) e é o primeiro angolano a participar, como
orador, no evento.
João de Morais, Especialista em logística militar
Fotografia: Eduardo Pedro | Edições Novembro
Foi convidado para estar presente como orador na 20ª Conferência
Anual sobre Transporte Aéreo Militar e Reabastecimento Ar-Ar, que se
realiza, em Lisboa, em Dezembro. O que leva na bagagem para o evento?
Começo
por dizer que a conferência é organizada pela prestigiada consultora
britânica SMI. O evento vai ter lugar, em Lisboa, de 3 a 4 de Dezembro. A
consultora é especializada em questões de Defesa e Segurança
Internacional. A conferência contará com a presença de altas chefias
militares de países membros da OTAN e da União Europeia, assim como de
outras organizações político-militares. O evento tem o apoio e
patrocínio de multinacionais de referência mundial, como a Boeing,
Embraer, Airbus, entre muitas outras. Este evento visa discutir,
essencialmente, dois temas relacionados com a Logística Militar Aérea,
nomeadamente “Transporte aéreo estratégico” e “Reabastecimento Aéreo”.
Que temas vai apresentar
no evento?
Eu,
particularmente, vou abordar o Transporte Aéreo Estratégico (TAE) e a
sua importância para o desenvolvimento das capacidades militares e
projecção de forças. O TAE é um facilitador fundamental do movimento
rápido de forças, especialmente quando se ameaça o terreno ou quando as
condições dificultam a liberdade de movimento. Devido à sua capacidade
de resposta, velocidade de execução e alcance global, o TAE também
oferece os meios mais eficazes para possibilitar e sustentar a projecção
rápida, até decisiva, do poder aéreo, em especial para teatros de
operações distantes e para locais remotos. O TAE é, no fundo, uma
solução rápida e maneira versátil de implantar, sustentar e
reimplementar forças militares.
Não vai falar de reabastecimento aéreo?
O
reabastecimento aéreo é um tema mais técnico, do ponto de vista da
engenharia aeronáutica. Durante o reabastecimento aéreo, a transferência
de combustível entre aeronaves em voo faz com que o caça de combate não
tenha que regressar à base, aumentando substancialmente a sua
capacidade de projecção combativa. O objectivo das operações de
reabastecimento aéreo é aumentar a eficácia, estendendo o alcance, a
carga útil ou a resistência das aeronaves receptoras, o que incrementa
consideravelmente a capacidade operacional e combativa dos aviões
empregues nas operações. Eu diria mesmo que, de todos os multiplicadores
de força e poder aéreo, o reabastecimento aéreo está entre os mais
significativos, devido à sua capacidade de resposta, velocidade de
execução e alcance global.
O que significa para si o convite, para ser um dos oradores na conferência?
O
convite surgiu directamente da organização, que quis agregar à sua
lista de prelectores altas patentes militares e especialistas civis que
possam acrescentar valor à conferência. Após algumas avaliações, recebi o
convite oficial para fazer parte do conjunto de oradores. Será, sem
dúvida, uma oportunidade para demonstrar os meus conhecimentos técnicos,
mas, também, uma ocasião para aprender com alguns dos melhores
especialistas do sector da defesa a nível mundial. Este evento servirá
como barómetro para medir a pertinência dos conhecimentos adquiridos nos
últimos anos.
Que impacto a conferência trará às organizações envolvidas, como a União Europeia e a OTAN?
Esta
conferência está a ser encarada com bastante expectativa por parte das
organizações político-militares, devido à sua relevância estratégica. A
União Europeia está em fase de implementar a Cooperação Estruturada
Permanente (PESCO) para a Defesa. A Estratégia Global da UE para a
Política Externa e de Segurança (EUGS) iniciou um processo de cooperação
mais estreita em segurança e defesa. Os Estados-membros da UE
concordaram em intensificar o trabalho nesta área e reconheceram a
necessidade de maior coordenação, investimento e cooperação no
desenvolvimento de capacidades da Defesa. As questões concernentes ao
Transporte Aéreo Estratégico e o Reabastecimento Aéreo constam da lista
de prioridades desta nova estrutura permanente, assim como da Agência de
Defesa Europeia (EDA). Relativamente à OTAN, os Estados-membros,
durante a cimeira decorrida no País de Gales, comprometeram-se a
investir dois por cento do seu Produto Interno Bruto (PIB) no sector da
Defesa, tendo em conta a volatilidade do ambiente de segurança e o
desenvolvimento da capacidade militar, assim como o aprimoramento da
técnica.
Que significado terá na sua carreira a participação neste evento?
É
um marco importante para a minha carreira. É sem dúvida um orgulho ver o
meu nome associado a personalidades de referência internacional.
Eventos como este abrem várias portas e acabam por ser uma montra com
alto nível de visibilidade, permitindo que importantes individualidades
acedam ao nosso trabalho e que haja troca de ideias. Desde que recebi o
convite, para participar nessa conferência, as solicitações para
desenvolver o meu trabalho noutras organizações internacionais e centros
de pesquisa duplicaram.
É o primeiro angolano a participar como orador na conferência. É verdade?
Espero
ser o primeiro de muitos que venham a ser convidados. É, de facto, um
orgulho poder ser o primeiro angolano a fazer parte desta prestigiada
conferência. Mas, espero não ser o último. Acredito que as minhas
passagens pelas estruturas da OTAN ajudaram a credibilizar o meu
percurso profissional e conhecimento científico. É fundamental que as
Forças Armadas apostem seriamente no plano de desenvolvimento
dos efectivos militares e civis, para que, em matérias militares, possamos estar devidamente representados e na vanguarda.
" A prontidão combativa está ligada à capacidade de fornecimento logístico"
Como pensa que Angola pode tirar benefícios dos seus conhecimentos, por ser especialista numa área tão estratégica?
Angola
pode beneficiar amplamente dos meus conhecimentos, uma vez que as
questões relacionadas com a logística militar são transversais a todas
as Forças Armadas mundiais. Vivemos numa era de escassos recursos e
existe a necessidade de uma gestão mais eficiente, feita com
cientificidade e rigor técnico. O actual processo de reestruturação e
modernização das Forças Armadas Angolanas pressupõe maior
racionalização, integração, eficiência e eficácia, considerados
fundamentais na concepção de uma possível nova arquitectura do
dispositivo que se pretende optimizar, tornando esta matéria bastante
actual e pertinente. É bom salientar que o grau de prontidão combativa
está intrinsecamente ligado à capacidade de fornecimento logístico às
forças destacadas no teatro de operações. Por conseguinte, a perícia
logística é uma condição “sine qua non” para qualquer estrutura militar,
que pretenda alcançar a vitória em combate. Portanto, a transmissão de
conhecimento nesta área tão estratégica torna-se primordial para um
melhor desempenho de quaisquer Forças Armadas que pretendam atingir
níveis de excelência.
Acha que existe alguma falta de reconhecimento, em Angola, das suas capacidades?
Estou
em crer que em Angola ainda exista a percepção de que os assuntos de
defesa e segurança devem ser geridos unicamente por quadros militares ou
paramilitares. Esta abordagem contrasta com a visão europeia ou
americana, que olham para os civis como uma importante fonte de
conhecimento técnico e científico para assuntos relacionados com a
elaboração da política de defesa nacional e de conceitos doutrinários
das Forças Armadas. Os países desenvolvidos têm no capital humano o
principal recurso, dentro de uma organização.
Como encara ou lida com esta situação?
É
de salientar que quadros com este tipo de formação e conhecimentos em
matérias de defesa são amplamente valorizados nos países desenvolvidos,
sob pena de os perderem para outras organizações. Infelizmente, Angola
ainda não dispõe de uma política eficiente de valorização e captação de
quadros de excelência, como vemos noutros países, acabando por perder
estes mesmos para outras nações ou organizações de renome. Apesar da
pouca dinâmica por parte das nossas instituições de Estado, tenho tido
bastantes solicitações para desenvolver o meu trabalho em várias
organizações, e acredito que, muito brevemente, irei abraçar um novo
projecto, no qual poderei fazer bom uso dos meus conhecimentos e
experiências.
Como caracteriza a actual situação da segurança internacional e nacional?
A
análise que faço sobre o actual ambiente de segurança internacional é
de que saímos de um período de relativa estabilidade para entrar num
momento de profunda transformação da ordem global. A década passada foi
caracterizada por volatilidade e interrupção, levando à contínua
adaptação e transformação nos níveis local, regional e global. Podemos
quase considerar este período de instabilidade global como “o novo
normal”. Os conflitos têm aumentado significativamente com o número de
guerras civis e ataques perpetrados por Estados e grupos armados,
aumentando, pela primeira vez, em uma década. Extremismo violento,
terrorismo e ameaças híbridas cresceram para contribuir com novas fontes
de grandes riscos à segurança, paz e estabilidade em todo o mundo. A
Europa tem lidado com ameaças convencionais, como formação militar e
instabilidade internacional, incluindo mudanças climáticas e
demográficas. A falha na mitigação das mudanças climáticas e desastres
naturais pode ser considerada uma questão de segurança internacional,
assim como as armas de destruição em massa, fraude de dados e ataques
cibernéticos. A natureza multidimensional das ameaças emergentes precisa
de novas abordagens de paz e segurança, fundindo noções convencionais
de poder com novos métodos científicos.
Em relação a Angola, como aprecia a situação em matéria de segurança?
Angola,
estando inserida numa região com elevada complexidade geoestratégica
(Região dos Grandes Lagos), tem feito um trabalho meritório no que diz
respeito à sua diplomacia militar. Angola tornou-se a placa giratória
para os assuntos de conflito regional, devido à vastíssima experiência
na mediação dessas matérias. O processo de reestruturação e modernização
das Forças Armadas Angolanas, em particular a Marinha de Guerra e a
Força Aérea Nacional, tendo em conta a extensão da costa atlântica, de
1.650 quilómetros, e os perigos da pirataria, vindos do “Corno de
África”, assim como a protecção e preservação dos recursos marítimos, é
fundamental para o desenvolvimento económico. As ameaças migratórias,
assim como a instabilidade vindas da fronteira com a República
Democrática do Congo, perigam a nossa estabilidade socio-económica e a
nossa segurança nacional, tendo em conta a fronteira terrestre de 2511
quilómetros que une os dois países.
fonte: jornaldeangola
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