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segunda-feira, 26 de julho de 2021

LUSOFONIA: Na história de Portugal (e do MPLA)

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Otelo Saraiva de Carvalho, militar e estratega do 25 de Abril de 1974, morreu hoje de madrugada aos 84 anos, em Lisboa. Foi um dos obreiros do 25 de Abril, sendo considerado o cérebro da revolução. Era o responsável pelo sector operacional da Comissão Coordenadora do Movimento das Forças Armadas (MFA), dirigindo as operações da revolução a partir do posto de comando no quartel de operações no Regimento de Engenharia n.º 1, na Pontinha, nos arredores de Lisboa.

No Movimento das Forças das Forças Armadas (MFA), que derrubou a ditadura de Salazar e Caetano, foi ele o encarregado de elaborar o plano de operações militares e, daí, ser conhecido como estratego do 25 de Abril.

No pós-revolução, foi comandante-adjunto do COPCON (Comando Operacional do Continente), passando a comandante efectivo em Março de 1975. Fez ainda parte do Conselho da Revolução durante o Processo Revolucionário em Curso (PREC), chegando à capa da revista norte-americana Time com o triunvirato formado com Francisco Costa Gomes e Vasco Gonçalves.

Após o 25 de Novembro de 1975, foi afastado de todos os cargos e chegou a estar preso. Foi ainda candidato às eleições presidenciais de 1976 e 1980, tendo perdido em ambas para Ramalho Eanes.

Nas presidenciais de 1976, a escolha no Conselho da Revolução recaiu sobre Ramalho Eanes, então Chefe do Estado-Maior do Exército, que logo recebeu o apoio do PSD, e em seguida do PS, CDS, MSD, PSDI, MRPP, da AOC e ainda organizações como a SEDES ou a CAP.

O ex-primeiro-ministro, almirante Pinheiro de Azevedo, que obteve 14,3% dos votos, e Otelo Saraiva de Carvalho, que estava em liberdade provisória depois de ter estado preso pelo seu envolvimento no 25 de Novembro, com 16,46%, foram os outros candidatos militares nas primeiras eleições presidenciais por sufrágio directo em democracia.

O PCP decidiu apresentar um civil, Octávio Pato, cuja votação, de 7,5%, o remeteu para o último lugar na corrida presidencial, que Ramalho Eanes ganhou com 61,59% dos votos.

Já em 1980, Otelo Saraiva de Carvalho criou o partido Força de Unidade Popular (FUP). Já em 1985, foi acusado de liderar as FP-25, organização armada responsável por vários atentados mortais, tendo sido condenado, em 1986, a 15 anos de prisão por associação terrorista. Esteve cinco anos preso e, em 1991, recebeu um indulto, tendo sido amnistiado anos depois, em 1996. No decorrer do processo das FP-25, foi também despromovido de brigadeiro a tenente-coronel.

Otelo Nuno Romão Saraiva de Carvalho nasceu em 31 de Agosto de 1936 em Lourenço Marques, Moçambique, e teve uma carreira militar desde os anos 1960, fez uma comissão durante a guerra colonial na Guiné-Bissau, onde se cruzou com o general António de Spínola, até ao pós-25 de Abril de 1974.

O antifascista e antigo membro do comité central do PCP Raimundo Narciso evocou hoje Otelo Saraiva de Carvalho como a “principal figura da revolução do 25 de Abril pelo seu papel na coordenação do movimento das Forças Armadas”.

Em declarações à agência Lusa, Raimundo Narciso, que já foi membro da direcção da Associação do 25 de Abril, lembrou ainda o papel desempenhado por Otelo Saraiva durante o “período revolucionário”, logo a seguir ao 25 de Abril, admitindo que, mais tarde, o ora falecido se tenha tornado posteriormente numa “figura controversa”.

“É contudo do ponto de vista político uma figura controversa, mas teve o apoio da esquerda e dos populares e nunca deixou de ser uma figura carismática”, observou.

Segundo Raimundo Narciso, a participação de Otelo no caso das FP-25 de Abril acabou por prejudicar a sua imagem, mas isso “não pode fazer esquecer o seu papel na organização”.

“Otelo nunca deixou de ser uma figura simbólica do 25 de Abril e que tem a simpatia do povo português”, conclui Raimundo Narciso.

Antigo membro do PCP e um dos maiores activistas da ARA (Acção Revolucionária Armada), criada pelo PCP na clandestinidade para lutar contra as guerras coloniais que envolviam Portugal e impulsionar o derrube do regime e da ditadura implantada em 1926, Narciso Raimundo foi expulso do PCP em Novembro de 1991, por contestar a posição da direcção do PCP, de apoio ao “fracassado golpe de Moscovo para afastar Gorbatchev”, Raimundo Narciso foi um dos fundadores da Plataforma de Esquerda (1992/95).

Em 1995, em representação da Plataforma de Esquerda, no âmbito de um acordo com Jorge Sampaio e depois com António Guterres, integrou, como independente, a lista de deputados do PS, por Lisboa. Em 1998 filiou-se no PS.

O grande amigo do MPLA

Otelo Saraiva de Carvalho, um dos mais determinantes amigalhaços do regime angolano do MPLA, no poder desde 1975, dizia que o atraso de Portugal a reconhecer independência de Angola foi “muito grave”. A reconhecer o governo do MPLA, queria ele dizer.

“Não há dúvidas de que o reconhecimento tardio da independência de Angola levou a que nem sempre as relações com Portugal sejam boas. Há coisas que deixam marcas para sempre”, salientou.

O “capitão de Abril” Otelo Saraiva de Carvalho considerou “muito grave” que Portugal tenha sido o 83º país a reconhecer a independência de Angola, algo que considerou ainda interferir nas relações entre os dois Estados. Sobretudo porque, acrescente-se, os militares portugueses já tinham dado o poder a quem queriam, ou seja ao MPLA, em detrimento dos acordos estabelecidos que o colocavam em pé de igualdade com a FNLA e a UNITA.

A posição de Otelo Saraiva de Carvalho foi defendida em entrevista à agência noticiosa oficial do regime, Angop, em Lisboa, a propósito dos 40 anos de independência de Angola. Nela o ex-líder das FP-25 (Forças Populares 25 de Abril foram uma organização armada clandestina de extrema-esquerda que operou em Portugal entre 1980 e 1987) assumiu que “tardou demais” o reconhecimento, não havendo dúvidas de se ter tratado de um “tremendo erro” de Portugal.

“Não há dúvidas de que o reconhecimento tardio da independência de Angola levou a que nem sempre, ainda hoje, as relações com Portugal sejam boas. Há coisas que deixam marcas para sempre. Isso tudo custou caro para as relações entre Angola e Portugal”, sublinhou Otelo Saraiva de Carvalho.

O antigo militar adiantou, numa tentativa de reescrever a história, que foi “tentada uma plataforma mínima de acordo entre os três movimentos de libertação”. Trata-se de uma mentira pois essa plataforma só seria implementada se acaso o MPLA não tivesse – com a ajuda militar de Cuba – tomado o poder em Luanda.

“Tínhamos mais preferência pelo MPLA, porque era o único movimento, por razões ideológicas e capacidade de gestão política, do qual tínhamos contacto e diálogo”, reconheceu também o líder das FP-25, uma organização terrorista portuguesa responsável por 13 mortes – às quais acrescem ainda as mortes de 4 dos seus operacionais – dezenas de atentados a tiro e com explosivos e de assaltos a bancos, viaturas de transporte de valores, tesourarias da fazenda pública e empresas.

Otelo Saraiva de Carvalho disse ainda que António Spínola, político conservador, tinha uma ideia completamente diferente de autodeterminação e de independência.

“Spínola tinha uma ideia de criar uma ‘Commonwealth’ à portuguesa, em que ele seria o Presidente da República e de todas as províncias ultramarinas. A perspectiva dele era gizar uma cultura ultramarina que conduzisse à paz e mais nada. Isso era completamente ridículo”, disse.

Segundo Otelo Saraiva de Carvalho, a visão do Movimento das Forças Armadas (MFA) passava por medidas para elevar o nível económico, cultural e social do povo português, sobretudo das classes sociais mais desfavorecidas.

“Para nós, o Governo saído do da revolução de 25 de Abril deveria, imediatamente, também, reconhecer o direito dos povos à autodeterminação, com todas as consequências que daí adviriam, mesmo a independência”, frisou.

Numa mensagem a propósito dos 40 anos de independência, Otelo Saraiva de Carvalho considerou “extremamente aliciante (re)construir um país”.

“É satisfatório sentirmos, eu e os meus camaradas, o sonho dos nacionalistas africanos em tornar rapidamente possível o alcance da liberdade, da dignidade e da soberania dos seus países”, destacou.

Folha 8 com Lusa

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Samuel

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