Falta de pressão popular, desorganização da oposição e ausência de alternativa devem garantir mais uma vez na Câmara a sobrevida de um presidente denunciado criminalmente e que amarga recordes de desaprovação.
fonte: DW África
O presidente Michel Temer: gravidade do caso não deve influenciar cálculos da maior parte dos deputados
Michel Temer deve sobreviver mais uma vez. Pouco antes de a Câmara votar a segunda denúncia criminal contra presidente, o Planalto não esconde sua confiança em mais uma vitória. Entre os oposicionistas, são poucos que apostam que um número mínimo de 342 deputados vai aceitar as acusações e votar pelo afastamento do presidente.
Nesta quarta-feira (25/10), a dúvida parece ser apenas se Temer vai ser capaz de repetir os 263 votosreunidos na primeira denúncia, em agosto.
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Mesmo amargando uma taxa de apoio popular que mal alcança 3%, digna de decretar a morte de um governo, Temer deve conseguir costurar a nova vitória graças aos mesmos fatores que prevaleceram na primeira votação: a ausência de pressão popular, a distribuição da favores aos deputados, a falta de uma alternativa e a fraqueza da oposição.
Nenhum desses fatores mudou de agosto até a data desta segunda votação. Em alguns casos, eles foram até mesmo reforçados, ainda que as acusações desta vez sejam mais severas.
Enquanto a primeira denúncia por corrupção focalizava em dois episódios - a conversa entre Temer e o empresário Joesley Batista e a prisão de um ex-assessor do presidente flagrado com uma mala de dinheiro -, a segunda leva de acusações detalha um grande esquema de desvios que se estendeu por 15 anos.
"É um caso bem mais grave, e diz muito sobre o caráter do presidente", afirma o professor de direito constitucional Rubens Glezer, da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo.
Mas a gravidade do caso não deve influenciar substancialmente os cálculos da maior parte dos deputados. São vários os motivos por que Temer deve sobreviver.
A falta de uma alternativa
Nas semanas que antecederam a votação da primeira denúncia, a imprensa e o mundo político especularam possíveis nomes que poderiam substituir Temer. Eram figuras como presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) ou até mesmo o ex-ministro Nelson Jobim. Nenhum desses nomes gerou concesso entre a classe política e as próprias figuras não se mostraram muito interessadas.
Desta vez, nem sequer houve uma discussão sobre possíveis substitutos e nenhum nome se apresentou para suceder Temer. No caso do impeachment de Dilma Rousseff, a presença de um vice e o comportamento ambicioso de Temer ofereceram ao mundo político uma alternativa para colocar no lugar da petista. Temer simplesmente não tem um Temer como adversário.
"Não aparecem alternativas no meio político, nas lideranças sociais e na sociedade civil para substituir Temer", afirma o cientista político suíço Rolf Rauschenbach, do Centro Latino-Americano da Universidade de St. Gallen.
A distribuição de favores e agrados
Temer mais uma vez repetiu o que já havia feito em junho e julho: distribuiu emendas parlamentares (verbas que são pedidas pelos deputados para uso em suas bases eleitorais) e ofertou cargos para garantir apoios de deputados. Na véspera da primeira denúncia, o presidente distribuiu 4,4 bilhões de reais. Desta vez, os valores foram um pouco mais "modestos", totalizando 1,8 bilhão em setembro e outubro.
E assim como ocorreu na primeira votação, Temer voltou a atender a pedidos de bancadas da Câmara, em especial a ruralista, que reúne mais de 200 votos. Em agosto, uma primeira leva de agrados já havia garantido 146 votos da bancada.
A oposição simplesmente não conta com uma máquina semelhante. Ela também não desenhou um plano de divisão das áreas do governo em uma eventual nova administração, ou uma espécie de "cheque pré-datado" para conquistar deputados interessados em favores, como Temer e seu círculo haviam feito ainda na articulação para afastar Dilma.
A reação do mundo político contra a PGR
Na sua derradeira distribuição de "flechadas", o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot também apresentou duas novas denúncias contra os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff, além de outros nomes do PT, do PMDB e do PP. Isso ampliou o discurso de vitimização que já vinha sendo usado por parte da classe política.
"O universo político em geral não gostou do que Janot fez", afirma o cientista político Rodrigo Prando, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, sugerindo que parte da oposição também atingida pelas denúncias não deve se empenhar pela aprovação de "mais uma denúncia do Janot".
Essa leva de denúncias foi apresentada depois de concluída a segunda votação, o que deve dificultar mudanças de posição entre deputados que votaram a favor de Temer e que temem ser alvos da Justiça.
O comportamento da oposição
A fraqueza da oposição em pressionar pelo afastamento de Temer ficou evidente na primeira votação. Vários deputados conseguiram bastante exposição ao discursar contra o presidente, mas nenhum deles emergiu como um grande articulador ou estrategista para reunir votos contra o Planalto, tal como Eduardo Cunha no caso do impeachment de Dilma.
Dois meses depois da vitória do Planalto, a oposição só tem oferecer mais uma tentativa de articular um esvaziamento da sessão de votação para pressionar por um adiamento. Em agosto, a tática fracassou quando vários deputados simplesmente ignoraram o plano.
E mais uma vez a oposição não apresentou uma proposta para a substituição de Temer. Nos bastidores, muitos rejeitam uma eventual ascensão de Maia, que poderia fortalecer o DEM e mudar o xadrez eleitoral de 2018.
A linha de frente contra Temer também continua sendo ocupada pelo PSOL e a Rede, que, apesar de barulhentos, não têm influência suficiente. A fraqueza e falta de empenho de parte da oposição, em especial dos deputados do PT, já levantou acusações de que alguns deputados estão apenas interessados em deixar Temer "sangrar" até 2018.
Silêncio das ruas
Temer pode ser o presidente mais impopular da história recente do Brasil, segundo algumas pesquisas, mas nos últimos meses as ruas não refletiram esse quadro. Na votação da primeira denúncia, apenas um manifestante solitário ocupou a Esplanada dos Ministérios para pedir a saída do presidente. Simplesmente não ocorreram protestos como na derrocada de Dilma.
E mais uma vez os deputados vão votar sem qualquer pressão das ruas. Os grupos de direita que organizaram as convocações contra Dilma decidiram novamente não convocar manifestantes. Entre a esquerda, apenas algumas poucas manifestações localizadas devem ocorrer nesta quarta-feira, em contraste com os atos rotineiros em apoio ao ex-presidente Lula.
E assim como ocorreu na primeira denúncia, nenhuma grande entidade empresarial se manifestou a favor da saída de Temer. "Com sinais, embora ainda tímidos, de recuperação da economia, o incentivo para que o empresariado deseje a saída de Temer é ainda menor", afirma o cientista político Prando.
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Samuel