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quarta-feira, 8 de setembro de 2021

EPL regressa à ribalta da discórdia

NO BALUR I STA NA NO KUNCIMENTI, PA KILA, NO BALURIZA KUNCIMENTI!...

                                                                    Marcelo Rebelo de Sousa

O sócio da Cooperativa Portuguesa de Ensino em Angola (CPEA), Yuri Guimarães, questionou hoje a decisão do Estado português de assumir “de forma transitória” a gestão directa da Escola Portuguesa de Luanda (EPL), depois de anos em silêncio.

Yuri Guimarães, cooperante e encarregado de educação, reagiu, em declarações à agência Lusa, à decisão do Estado português de assumir de forma transitória a gestão directa da EPL, antes gerida pela CPEA, que cessou funções após um litígio com alguns cooperantes.

O cooperante sublinha ainda que não percebe a decisão do Ministério da Educação português “que nunca respondeu às solicitações para que interviessem e às respectivas denúncias feitas pela cooperativa há mais de quatro anos, devidamente registadas”.

“Não percebo porque é que sem qualquer intenção ou compromisso com a verdade que demonstraram ao ignorarem e ao remeterem-se ao silêncio face às nossas denúncias, porquê que hoje vem publicamente manifestar essa transição sem qualquer comunicação prévia à comunidade educativa da EPL”, referiu.

Yuri Guimarães questionou também o facto de o Estado consentir inicialmente “as irregularidades todas e, na véspera de ser chamado a depor em tribunal, toma esta decisão”.

“Não temos qualquer justificativa para essa posição repentina, até porque tão logo os cooperantes informaram do que se estava a passar e solicitaram a intervenção do Estado português para que ao menos pressionassem para que fosse realizada uma Assembleia Geral fomos ignorados, pois diziam eles que estava tudo bem, ou seja, que a escola estava a ser bem gerida”, salientou.

No seu entender, o “dono da escola consentiu que uma cooperativa não credenciada gerisse a sua escola por mais de 20 anos e sem contrato de gestão”.

Para o cooperante, a situação foi assim mantida pelo Ministério da Educação, porque “a cooperativa serviu apenas de um instrumento para financiar uma escola pública, onde o Estado não tem qualquer ónus e tão-pouco assegura os direitos dos alunos consagrados na lei de bases do ensino português, no estatuto do aluno, no estatuto das cooperativas de ensino e na Constituição portuguesa”.

Yuri Guimarães frisou que sempre defenderam um tratamento em igualdade de circunstâncias em relação às congéneres dos restantes Estados-membros dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP).

Uma informação avançada à agência Lusa pelo Ministério da Educação de Portugal indica que, com a cessação de funções da CPEA, “o Estado português assume de forma transitória a gestão directa da Escola Portuguesa de Luanda até à conclusão do procedimento concursal para a nova gestão”.

A Escola Portuguesa de Luanda – Centro de Ensino e Língua Portuguesa foi criada ao abrigo do protocolo relativo ao Centro de Ensino e Língua Portuguesa de Luanda, celebrado entre os governos de Portugal e Angola, tendo sido formalmente constituída em 2006.

A cessação de funções da CPEA culmina uma série de episódios que opunha um grupo de cooperantes e a direcção da EPL. No ano passado, cerca de 300 cooperantes da CPEA assinaram um requerimento defendendo a realização de uma assembleia geral extraordinária para discutir a revisão dos estatutos e propuseram a destituição dos atuais órgãos sociais da cooperativa e a nomeação de uma comissão de gestão interina.

A CPEA rejeitou, na altura, as acusações, alegando estar em causa uma tentativa de tomada do poder e justificou os aumentos impostos no ano lectivo 2020/2021 com a necessidade de assegurar a sobrevivência da escola.

O aumento das propinas motivou vários protestos dos cooperantes que avançaram para o tribunal para travar a medida. No dia 9 de Julho, o Tribunal de Luanda decretou uma medida cautelar impedindo o aumento das propinas e intimando a CPEA “a não colocar qualquer obstáculo e a aceitar a matrícula de todos os alunos educandos dos cooperadores para o ano lectivo de 2021/2022” e a abster-se de “qualquer conduta que coloque em risco o direito fundamental dos educandos à frequência da escola”.

No entanto, os cooperantes que tinham avançado com a acção contra a CPEA queixaram-se que a entidade gestora da Escola Portuguesa estava a desobedecer à decisão do tribunal, continuando a cobrar propinas e a fazer matrículas com os aumentos impostos.

Na sequência desta queixa, o tribunal da comarca de Luanda remeteu ao Ministério Público um pedido para a abertura de um processo pelo crime de desobediência contra o representante legal da Escola Portuguesa em Luanda (EPL), segundo um despacho a que a Lusa teve acesso.

Na altura, a Lusa contactou telefonicamente Horácio Pina, que assumia a gestão da EPL, mas o mesmo apenas referiu que não tinha sido notificado de qualquer informação do tribunal, remetendo para o Ministério da Educação português quaisquer esclarecimentos sobre o assunto.

Para o Ministério da Educação português, e “à semelhança do que acontece com outras escolas portuguesas no estrangeiro, a EPL tem-se evidenciado como uma instituição educativa de grande prestígio, desempenhando um papel primordial na promoção do ensino e difusão da língua e cultura portuguesa e um relevante papel no reforço dos laços de amizade e de cooperação entre o Estado angolano e o Estado português”.

“O Estado português permanece empenhado em cumprir os objectivos centrais da Escola Portuguesa de Luanda e no estreitamento dos laços linguísticos e culturais entre os dois povos”, afirma o ministério.

Em Abril de 2018, a Direcção da cooperativa, sem fins lucrativos, que gere a Escola Portuguesa de Luanda (EPL) diz-se sem meios para ultrapassar o impasse em torno das actualizações salariais exigidas pelos professores, em greve, apelando à intervenção do Governo português.

A posição foi assumida por Paulo Arroteia, administrador para área financeira da Cooperativa Portuguesa de Ensino em Angola (CPEA), que gere a EPL, recebendo para o efeito um subsídio anual do Estado português, que em 2017 ascendeu a 776.000 euros, num orçamento global, para o funcionamento da escola, incluindo pagamento dos professores, a rondar os 13 milhões de euros.

“O Estado português tem de intervir. Tem que tomar decisões, não se pode andar a esconder aqui atrás, nós que decidamos e vocês vejam se desenrascam aí”, criticou Paulo Arroteia, alertando que “não é só a cooperativa que tem a responsabilidade de gerir a escola”.

“Tem que haver, da parte do Estado, representado pelo patrono da escola [embaixador português], um maior apoio. Eles têm também que tomar uma posição nisso, não podem simplesmente estar à espera do que é que vai acontecer. E é isso que está a acontecer, eles não se manifestam”, afirmou ainda o responsável, acrescentando “tudo o que se está” a passar na EPL foi transmitido pela cooperativa às autoridades portuguesas em Luanda.

Contudo, garantiu que, desde logo, o subsídio que Portugal paga para a manutenção da EPL já estava desactualizado e que “nem de perto, nem pouco ou mais ou menos” chega para gerir a escola, aliado ao diferendo entre pais, que recusam pagar mais, em kwanzas, pela propina mensal, e professores, que não querem perder, em euros, o valor do salário que recebem em moeda angolana, em forte desvalorização.

Segundo informação reunida então junto da EPL, o protesto dos professores da escola, com dias de greve interpolados a 17, 18 e 19 de Abril, 08, 09 e 10 de Maio, e 08, 19 e 27 de Junho, passava por reivindicações salariais, nomeadamente devido à desvalorização, superior a 30%, do kwanza para o euro, desde Janeiro de 2018.

“Nem uns, nem outros, ninguém aceita. Uns estão irredutíveis, que são os encarregados de educação, que não querem subir dos 112 [propina mensal de 112.200 kwanzas]. Os outros, os professores, querem o salário ao câmbio do dia em euros e não querem reduzir mais nada. Então, há aqui um impasse”, admitiu o administrador.

Contratualmente, os salários em kwanzas, reclamam os professores, estão indexados ao euro, mas a recusa dos pais e encarregados de educação, a 8 de Março, em aprovar um orçamento rectificativo para 2018, com aumento da propina mensal para compensar a actualização salarial, levou à convocação da greve, à qual aderiram praticamente todos os professores. “Apenas um professor apareceu, num universo de 133”, admitiu Paulo Arroteia.

De acordo com um texto do Folha 8 de 17 de Abril de 2018, a funcionar em Luanda há 30 anos, as actuais instalações foram construídas pelo Estado português, em terrenos no centro da cidade disponibilizados para o efeito pelo Governo angolano.

Com cerca de 2.000 alunos, do pré-escolar ao 12.º ano de escolaridade, a EPL segue o currículo e calendário escolar de Portugal, estando sob alçada do Governo português, embora com a gestão a cargo da CPEA.

Com uma propina mensal (10 meses) estipulada actualmente em 112.200 kwanzas, este valor equivale aos cerca de 546 euros e foi aprovado em Dezembro, no orçamento para 2018. Contudo, na prática, o valor em kwanzas equivale actualmente a cerca de 415 euros, devido à desvalorização cambial, valor que a Direcção da CPEA diz não ser suficiente para actualizar os salários dos professores.

“Eles têm uma base que é contrato deles, que é legal e está em euros. Isto é uma escola portuguesa, baseada numa tabela salarial portuguesa e os contratos são feitos em euros. A base de tudo é essa. Eles querem actualizar o valor em euros aos kwanzas que recebem”, explicou Paulo Arroteia, sobre o caderno reivindicativo dos professores da EPL.

O conflito actual agravou-se com o chumbo dos pais, enquanto sócios cooperantes da CPEA, ao orçamento rectificativo apresentado pela CPEA em assembleia-geral, prevendo aumentar a propina mensal de 2018 para 130.000 kwanzas (480 euros), acrescida de actualização à taxa de câmbio do dia 20 de cada mês.

Pais e encarregados de educação não aceitam, criticando a falta de transparência das contas da CPEA – que a instituição afirma serem auditadas por Portugal – e alegando que todos os professores, além daqueles que são do quadro do Ministério da Educação, destacados em Angola, querem beneficiar de um salário indexado ao euro, incluindo os professores contratados localmente, com dupla nacionalidade.

Além disso, alegam que os salários que recebem em Angola, em kwanzas, não sofreram qualquer actualização, apesar da desvalorização cambial, assumindo-se sem meios para fazer face a novos aumentos de propina.

Foto: Visita de Marcelo Rebelo de Sousa à Escola Portuguesa de Luanda

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Samuel

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